Um Inspirado (e
Versátil) Triunvirato
Texto
e fotos ridículas por Trevas
A
segunda edição do festival Solid Rock trouxe ao Brasil três bandas
representando três escolas diferentes do som que amamos: levando a bandeira do Hard/Classic Rock, temos o
multinacional Black Star Riders, o pouco falado (por aqui) Spin Off do Thin Lizzy, uma das bandas de rock mais influentes da história.
Aos
fãs dos anos 1990 e do grunge (um rótulo odioso forjado pela imprensa que colocou
no mesmo saco bandas que nada tem em comum em termos de sonoridade, mas fazer o
quê), temos o Alice In Chains,
provavelmente o mais pesado expoente daquela cena e que vive um indiscutível
segundo auge criativo.
E
para quem ama Heavy Metal, a cereja do bolo, que tal um revigorado Judas Priest, inventor de 90% dos maneirismos audiovisuais do gênero, com
um show para lá de caprichado amparando um dos melhores discos de sua extensa
carreira?
Pois
é, foi com ouvidos esfomeados que eu e minha esposa e parceira de perrengues
musicais rumamos para o longínquo Km De
Vantagens Hall (maldita seja essa josta de Naming Rights) para
conferir esse trio, que se apresentou no Rio sem a chancela do festival citado
(sei lá o porquê).
Black Star Riders
Às 19h em ponto é
chegado o momento da primeira atração da noite, o Black Star Riders, que sobe ao palco sem muito
alarde. Combo multinacional que começou suas atividades em dezembro de 2012,
como uma espécie de continuação criativa do legado do Thin Lizzy, o quinteto
começa com os dois pés no acelerador, mandando duas faixas do ótimo disco de
estreia em sequência, seguindo as mesmas com o clássico Jailbreak, a música que elevara o TL ao status de titã do rock décadas atrás.
A banda é uma máquina
tão azeitada que nem corda de guitarra estourando e baixo pifando a fase ativa
foram capazes de fazer os caras perderem a compostura. Pudera, o quinteto pode
ser composto por peças pouco reconhecidas aqui debaixo da linha do Equador, mas
tem toneladas de experiência nas costas.
O baterista Chad Szeliga é um dos
muitos pistoleiros de aluguel “descobertos” pelo ursão Zakk Wylde, que tem mão
cheia para escolher bons músicos. O bom baixista Robbie Crane tem extenso
currículo, que inclui gente como Ratt
e Lynch Mob. Esquentando o banco deixado por Damon Johnson para a
chegada futura de Christian Martucci (do Stone Sour), temos Luke Morley (do subestimado combo britânico de Blues Rock, Thunder) que faz bonito nas seis cordas,
eclipsando parcialmente seu colega mais famoso. O que chega a ser curioso
quando o tal colega atende pelo nome de Scott
Gorham, o lendário axeman californiano do Thin Lizzy, que até está lá no palco, mas como tem ficado evidente de uns
anos para cá tem deixado cada vez mais o protagonismo na banda em outras mãos. Mais
especificamente, nas mãos tatuadas de Ricky
Warwick, frontman, guitarrista e principal compositor do BSR, que detona com sua bela voz (com
influência explícita do saudoso Phil
Lynnot) e muito carisma (pudera, o
cara já fez parte do New Model Army e conquistou o Reino Unido com o The Almighty na década
de 1990).
Ricky se recusa a deixar a
banda, evidentemente desconhecida de boa parte do público, assumir o status de
mero coadjuvante, comandando as ações com muita energia nos parcos 45 minutos de show munido
de doses beneficamente equilibradas de simpatia e marra. E o resultado valeu o
esforço, os aplausos ao final da apresentação foram muito além daquelas palmas
respeitosas e protocolares.
O quinteto sai do Metropolitan (esqueçam o nome idiota que a casa assumiu, por favor)
com a certeza de ter angariado mais uma penca de fãs. Um pequeno grande show (NOTA: 9,00)
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Black Star Riders |
Alice In Chains
Com dois imensos e
polêmicos praticados de iluminação em cada lado da bateria, o quarteto
estadunidense começa seu set com a poderosa Check My Brain. Sim, iniciar o show em um
festival com uma música que nem é do disco mais recente nem da fase clássica
diz muito sobre o caráter do Alice In Chains,
uma banda única que sempre trilhou um caminho igualmente único sem nunca
comprometer seu som ou postura sob os ditames da mídia.
A reverberação positiva
pela maioria esmagadora do público que já enchia a casa (que nessa noite chegou
a uns 70% da lotação, presumo) a esse surpreendente início de show mostra que o
tortuoso caminho escolhido pelo renascido quarteto colheu seus frutos,
aparentemente deixando para trás a envelhecida picuinha dos fãs de Metal/hard em
relação à “geração Seattle”.
Mas
se criativamente só tenho boas palavras a escrever sobre o AIC, já não consigo ser tão entusiasta do show dos caras. O peso
monolítico das músicas em suas versões de estúdio diminui consideravelmente no
ambiente dos palcos. Talvez o exímio Jerry
Cantrell, com seu timbre
idiossincrático e encardido, sinta falta de companhia. Não ajuda em muito o
baixo do sempre preciso Mike Inez estar enterrado na mixagem (para
desespero do bom Sean Kinney) e a guitarra eventual de DuVall parecer meramente cenográfica.
Em determinado momento de um solo, visivelmente Cantrell olhou para o frontman
com aquela cara de “caralho, cadê o som da sua guitarra?”.
Mas esteve longe de ser um show ruim.
O
repertório foi montado lotado de clássicos entremeados com bem selecionados
números dos (grandes) discos recentes, todos muito bem recebidos e cantados a
plenos pulmões pelos fãs.
Uma banda competente
e precisa, mas que deixa a nítida sensação de que as faixas originais de
estúdio têm mais energia do que suas contrapartes ao vivo.
Ah, e nem adianta tentar culpar o “novato”. William DuVall merece um capítulo à parte, com sua esguia silhueta e
portentoso afro (ok, não dá para não deixar de citar a semelhança dele com um
jovem Hélio de La Peña), o cara é um
achado. União rara de um grande talento com carisma e visual de rock star, o Alice In Chains conseguiu o
pacote completo. Some a isso o fato da banda sempre prestar sua emocionante
homenagem ao saudoso Layne Staley e as viúvas dificilmente poderão
reclamar do que a banda se tornou. Enfim, um show competente e bem feito de uma
banda que simplesmente funciona melhor em estúdio (NOTA: 7,50).
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Alice In Chains |
Judas Priest
Com
o palco menos ornado de plataformas e estruturas mecanizadas do que em outras
ocasiões, o quinteto britânico apostou acertadamente num visual baseado em
projeções no imenso telão de fundo para adornar sua apresentação. Obviamente só
foi possível atestar isso após a queda da bela cortina aos primeiros acordes da
potente Firepower. Se a banda já
havia se mostrado revigorada na turnê anterior, que marcara a efetivação de Richie Faulkner e a recuperação de Rob
Halford após uma operação delicada
que o salvou das dores lancinantes nas costas com as quais havia convivido por
quase duas décadas, dessa vez a energia que emanava do palco se fazia quase
palpável.
Que o diga a sequência
quase inacreditável com Running Wild, Grinder, Sinner e The Ripper, cantadas de uma maneira tão
perfeita que se calhasse de fechar os olhos eu bem poderia acreditar que Rob, do alto de 67 anos bem vividos,
havia rejuvenescido uns 30 anos! A deusa do metal, muito mais solta no palco
que em qualquer momento nos últimos 15 anos, estava em chamas. Mas não estava
sozinho.
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Halford, imponente |
Faulkner, exatamente 30 anos
mais novo que o patrão, quicava pelo palco, assumindo um protagonismo muito bem-vindo,
em especial quando lembramos que a banda teria que suplantar a ausência de Glenn Tipton, impossibilitado de excursionar por conta dos efeitos da
doença de Parkinson. Seu substituto (provisório), Andy Sneap (os cornos do
Jason Statham), um guitarrista reconhecidamente técnico, agitava, mas de
maneira comedida, como que respeitosamente mostrando que em nenhum momento
intenciona “pegar o lugar” de um dos maiores ícones do gênero. Ian Hill, o Stênio Garcia Headbanger, fazia o mesmo papel
que faz desde o início da banda, e Scott
Travis, esse estava muito mais
empolgado do que em qualquer outra das 7 vezes que vi a banda, inclusive
brincando com a plateia ao microfone. A diferença de postura fica ainda mais
clara quando lembramos que, desde a época do Ripper, a banda sistematicamente dava intervalos grandes entre uma
música e outra. Aqui, os intervalos se resumiram a dois, para lá de mínimos.
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Faulkner, em chamas |
E quando uma banda como o Judas
está com fogo nas ventas, amparada por um som perfeito (ainda que muito alto) do
Metropolitan, resta um grande set list em mãos para termos uma noite memorável. E os caras são, das
veteranas do metal, uma das bandas que mais resgata pérolas de sua discografia.
E tome belezuras como Desert Plains, Night Comes Down e Freewill Burning (com
uma anacrônica, mas inofensiva, homenagem ao Senna no telão, politizada de forma abobalhada por veículos de
imprensa conservadores) dividindo terreno com as excelentes músicas do Firepower (No Surrender, Lightning Strike e Rising From Ruins), todas recebidas efusivamente pela mesma plateia que aplaudira
o Alice In Chains antes. Isso
sim é bonito de ver. Uma pena que na reta final o repertório (mais curto do que
nas últimas turnês, uma exigência da idade?) acaba por descambar para as
obviedades, como Hell Bent For Leather, Breaking The Law, Painkiller, Living After Midnight e You’ve Got Another Thing Coming. Não que isso seja exatamente ruim,
cada uma dessas “obviedades”, merecedoras de espaço cativo no panteão dos grandes
hinos do Metal, tendo feito o público quicar e cantar com emoção. Que é o que
importa, afinal. E Painkiller, essa
ganhou a melhor rendição que já vi a banda fazer dela ao vivo. Ao final do
show, um dos melhores que já presenciei do Judas,
os tradicionais sorrisos e agradecimentos e uma mensagem no telão “The Priest Will Be Back”. Que os Deuses
do Metal assim permitam! (NOTA:10)
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When The Show Comes Down... |
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O Reino dos Metal Gods |