Tamuya Thrash Tribe - The Last Of The Guaranis (Cd-2016) |
Programa De Índio
Por
Trevas
Meu primeiro contato
com Tamuya Thrash Tribe (ou TTT) aconteceu de surpresa. Uma grata
surpresa, diga-se. Fui ao Vivo Rio em 2012 assistir ao show do Black Label Society, banda de Zakk Wylde. Quando adentrei a casa o TTT já estava no palco, detonando um set curto, mas bem poderoso.
Dois anos depois, tive a oportunidade de rever o show dos caras minada pela
falta de informações sobre o horário de início do show, que abriu a estrondosa
passagem do Amon Amarth pelo Circo Voador. Show
perdido, aproveitei para garantir uma cópia do Ep United, primeiro
rebento dos cariocas. United é um
disco bacana, um bom cartão de visitas de uma promissora banda. Mas quem viu ao
menos um pouco de qualquer show dos caras, com seu Thrash Metal + Death Metal Melódico que em muito lembra o dos já
citados Vikings suecos, sabia de
cara que a banda tinha muito mais a mostrar. E então um dia fui surpreendido
pelo anúncio da arte de capa do que seria o disco de estreia, intitulado The Last Of The Guaranis. E sim, tinha cheiro de coisa especial.
Arte Gráfica e
Conceito:
O anúncio da
impactante arte gráfica, uma belíssima e sombria ilustração da artista plástica
Isabelle Araujo, baseada em ideias do vocalista/guitarrista Luciano Vassan e inspirada nos trabalhos do premiado fotógrafo Steve McCurry já mostrava em parte o conceito por detrás do disco. A emblemática
capa traduz em uma só imagem o acachapante índice de suicídio entre os povos
indígenas, fruto de conflitos por terras onde a cultura e os valores religiosos
dos nativos são violentados em prol do lucro do homem branco. The Last Of The Guaranis chafurda
tematicamente nas entranhas de alguns desses conflitos desde suas origens,
remetendo aos seus desdobramentos na violência urbana que encontramos hoje nas
grandes cidades. Forte, não. Mas de boas intenções (e pretensões) o inferno
está cheio, e de nada adiantaria o belo conceito se não estivesse acompanhado
de uma boa contraparte musical. Para nossa sorte e deleite, a parte musical não
fica nem um pouco atrás...
Arte Gráfica da Edição Especial (capa/contracapa) |
Música:
O disco abre
mostrando suas raízes, com um hipnótico cântico indígena entoado pelo Coral de Crianças Guarani. Logo somos jogados de um
ambiente aparentemente pacífico para o olho de uma tempestade. Nessa
tempestade, a dita voz de Nhanderú é
expressa pelo trovão, ou como dizem os donos dessa terra, Tupã-Cinunga. Musicalmente o TTT
surge como o trovão expresso na letra, matador, uma versão tupiniquim perfeita
dos suecos do Amon Amarth. A voz de Luciano Vassan (que
escreve boa parte do material e também toca guitarra), inclusive, lembra a de
um imberbe Johan Hegg. O apoteótico interlúdio em tupi
vem nos lembrar que não estamos nem de longe falando de meros copistas.
O ponto (ou cantiga) de umbanda, Brado
de Xangô (na voz da Mãe de Santo Gleyds
Granden), faz o perfeito contraponto
com a ferocidade de Senzala/Favela. Essa música traz elementos
tribais (ao longo do disco, vários percussionistas convidados auxiliam o
excelente baterista Bruno Rabello), guitarras que lembram os sons
mais pesados do Paradise Lost e letras em inglês e português
para fazer a correlação entre o fim da escravatura e o início da favelização e
segregação racial aliada ao constante desmerecimento dos valores culturais afrodescendentes.
Confesso não ter nenhuma simpatia pelo Marcelo
D2, mas sua participação nessa
música cai como uma luva, ajudando a criar o clímax de um possível novo
clássico do metal nacional. A destacar, a bela produção de Sidney Sohn Jr, que consegue equilibrar a crueza
com diversos elementos exóticos que engrandecem em muito o resultado final.
TTT - 2016 |
The Last Ball Of The
Empire é mais direta e tem menos
chances de assustar os fãs mais ortodoxos de Metal. As guitarras cortantes de Vassan e Leonardo Emanoel erguidas
imponentemente sobre a base monolítica da cozinha formada por Rabello e João Paulo Mugrabi (baixo). Nela sinto
pela primeira vez um dos pequenos problemas do disco, a pronúncia do inglês de Vassan. Longe de ser macarrônico,
provavelmente só incomodará os muito detalhistas ou os native speakers. Mas
esse é um dos poucos pontos que consigo enxergar onde a banda pode evoluir, até
por que a qualidade do material é tanta que os mercados internacionais devem
estar na programação. A excelente faixa título é outra a trilhar um caminho
mais Amon Amarth, com adicionais tribais e alguns momentos meio Dino Cazares na guitarra.
A voz de João Cavalcanti (filho de Lenine e vocalista do Casuarina), dá vida a perfeita Vinte e Cinco, que serve de introdução
à Violence And Blood (ver vídeo),
numa das melhores fusões música brasileira/Metal que se tem notícia desde Roots do Sepultura. Apoteótica! A
Call From Xapuri e Conjuration
são muito boas, mas empalidecem um pouco perante o restante do material. O
disco se encerra de maneira mais calma, com a balada Urutau’s Cry mostrando
que o gogó de Vassan ainda se faz
muito mais eficiente nos momentos mais violentos do que nos de maior sutileza. Hàhè’m nos apresenta à bela voz de Zahy Guajajara, naquela que pode ser definida como uma The Great Gig In The Sky, do Pink Floyd, se a mesma fosse cantada em tupi por uma banda de metal.
Exótico? Absolutamente. Mas cara, funciona muito bem!
Saldo Final
The Last Of the Guaranis é um ousado trabalho desde sua
concepção gráfica até sua execução musical. Acredito piamente que tem muita banda
boa no cenário rocker brasileiro colocando nas prateleiras físicas ou digitais
uma penca de bons lançamentos. Mas não me lembro a última vez que fiquei tão
admirado com um disco de estreia de uma banda de Heavy Metal brasuca como fiquei
com este Cd. Só o tempo dirá, mas apostaria sem medo que The Last Of the Guaranis será lembrado
no futuro como um dos grandes clássicos de nossa música pesada. Um dos melhores
discos desse belo ano para a música pesada que foi 2016!
NOTA: 9,10
Pontos
positivos: excelentes integração entre o Metal e música brasileira
Pontos
negativos: pode assustar os bangers mais ortodoxos
Para
fãs de: Amon Amarth, Sepultura
Classifique como: Melodic Death Metal, Thrash
Metal
Bônus
da Edição Especial:
Quem comprou o disco
antecipadamente pelo Site do TTT
recebeu em mãos um belo pacote em formato DVD/Digipack, contendo um encarte
caprichado e um segundo Cd. Esse
segundo Cd é a versão remasterizada
do Ep United, com a cozinha regravada pela formação atual e duas faixas
bônus acústicas. Como eu falei no início da resenha, United representou um cartão de visitas bacana do potencial da
banda. Mas nem de perto faz frente ao material do novo disco. Ainda assim, um
ótimo complemento, ainda mais por conta do formato, que valoriza bastante a
bela arte gráfica. Coisa de primeiro mundo.
Capa Original de United |
Caraca, essa banda merece um grande respeito por parte do público. Fazer um metal incorporando ritmos e linguagem indígenas, é uma coisa realmente inovadora. A banda esta fazendo o que espero de uma banda: botando a cara pra bater e procurando sua identidade. PARABÉNS mesmo a ela e vamos valorizar. Metal Nativo é coisa nossa, brasileira.
ResponderExcluirfala, Moshilão!!!
ExcluirTambém acho que a banda tem uma cara bem própria com a mistura proposta. Uma grata surpresa esse disco, espero que chegue aos ouvidos de mais pessoas.
Abração
T