Para os malucos(as) que como eu tem prazer em destrinchar as histórias que permeiam a trilha sonora que escolhemos para nossas vidas. E quantas histórias interessantes se escondem em cada esquina desse vasto mundo do rock! Vocês encontrarão por aqui resenhas de shows, discos, livros, dvds (blu-rays) e notícias comentadas sobre o mundo do rock. Espero que vocês gostem e visitem sempre ou eventualmente. Eu, certamente, me divertirei muito escrevendo aqui.
Se um dia alguém
ousar escrever um livro sobre a história do DoomMetal, pode apostar
que alguns capítulos deverão ser reservados aos suecos do Candlemass. Um dos pioneiros e ícones do gênero, infelizmente a
banda tem sofrido com uma estranha síndrome de morto-vivo. Envolto em uma série
de problemas de saúde, o líder, baixista e compositor de 99% do que os caras já
fizeram, LeifEdling, anunciou o encerramento das atividades do Candlemass, lá em 2012. Segundo reportado
à época, ele queria que a banda parasse no topo, antes de começar a lançar
discos “meia-boca” (como aliás foi o fraco canto do cisne, PsalmsForTheDead). O fim não durou muito. A banda continuou a excursionar aqui
e acolá, com Leif raramente subindo
aos palcos e o microfone sendo entregue ao amigo e colaborador eventual MatsLevén (Therion, Malmsteen). E em comemoração dos 30
anos do disco de estreia, em 2016, lançaram até mesmo um bom Ep, DeathThyLover. Eis que sou pego de surpresa ao
me deparar com mais um Ep lançado na
surdina, HouseOfDoom, que inclusive
ganhará edição nacional. Vamos ver o que nosso adorável zumbi aprontou dessa
vez.
Leif e sua trupe
A faixa título é Candlemass clássico, não traz
absolutamente nada de novo ou excepcional, mas deve agradar quem estava com
saudade do som único dos suecos.
FlowersOfdeception
sonoramente até remete ao ótimo disco de retorno da formação clássica, mas sofre
do mesmo mal que aflige boa parte das composições atuais de Leif em seus muitos projetos
diferentes, uma certa preguiça nos refrães. Uma pequena decepção, só para não
perder o trocadilho. A acústica e climática Fortuneteller eleva o nível, mas tem cara de quem funcionaria melhor
em algum disco do Avatarium. DollsOnAWall é uma curta e desinteressante
instrumental que encerra enigmaticamente os parcos 19 minutos de música desse Ep.
Veredito
da Cripta
Seis anos atrás LeifEdling anunciara o fim do Candlemass
dizendo que não queria que a banda passasse a lançar discos meia-boca. Caro Leif, era melhor ter mantido o caixão
fechado, pois meia-boca é exatamente o termo que define com precisão esse HouseOfDoom. Recomendado somente
para os tarados pela banda e completistas de plantão.
Confesso que havia
deixado a tarefa de conferir o som dos californianos da Earthless de lado zilhões de vezes, mesmo com inúmeras
recomendações vindas de gente muito boa. Esquecimento? Em boa parte. Mas também
um pouco de descrença, sabia que os caras tem projetos de jazz, ostentam uma
predileção por sons instrumentais repletos de jams e um bocado de psicodelismo, e imaginei algo meio metido à besta
e sem muita pegada. Bom, até eu esbarrar com essa belíssima arte de capa e
pensar com meus botões: “alguém que faz um som blasè jamais apostaria numa capa
tão visceral, né?” . Talvez fosse finalmente a hora de dar atenção ao Earthless. Lá vamos nós então embarcar na
primeira viagem rumo ao paraíso negro de um dos powertrios mais bem
falados da atualidade.
O trio, que jura que não faz uso de psicotrópicos, só café e chá...ah, sei...
GiftedByTheWind dá o tom do disco, uma paulada
setentista com ótimos riffs, solos destruidores, baixo irrequieto e aquelas
linhas vocais meio soltas e cheias de feeling que te fazem até esquecer que o
cantor nem tem lá uma bela voz.
Um jorro de fantasmagórico feedback faz a ponte entre a abertura e EndToEnd, com riff
cáustico e aquela cozinha matadora que, em conjunto com a voz de IsaiahMitchell, acaba remetendo ao GrandFunkRailroad. O trio traz composições com cara da primeira metade dos
anos 1970, e o faz com aquele senso de liberdade e com uma pegada
impressionante, o que a cozinha de MarioRubalcaba e MikeEginton demonstram
na excelente ElectricFlame é de causar ereção em qualquer
saudosista. E não, enaltecer os caras não significa diminuir o poder de fogo do
guitarrista/vocalista IsaiahMitchell. Se os vocais do cabrunco,
principal compositor do trio, demandam alguma boa vontade aos não aficionados por
Budgie, Rush ou GrandFunk, as guitarras são absolutamente
incontestáveis: feeling absurdo nos solos e poder e muita criatividade nos
riffs, sempre com timbres caprichados. Ah, e se você que já conhece a banda
ainda não ouviu o novo trabalho, deve estar achando um bocado estranha a
citação de vocais em todas as músicas. Sim, os caras fizeram diferente dessa
vez, as músicas, ainda que tenham como destaque suas excelentes passagens
instrumentais, dessa vez são calcadas numa abordagem de canções mais diretas,
uma abordagem para lá de acertada, diga-se. A exceção se faz em dois números: a
rápida VoltRush, curiosamente a única a ganhar um vídeo oficial.
A segunda instrumental é a frenética faixa que nomeia a bolachinha: aliás, que
petardo é BlackHeaven, a música, com performances estelares do trio e pequenas nuances
que remetem até mesmo à BlackSabbath!
Mas o melhor foi guardado para o final, SuddenEnd, uma power balada
viajandona que faz frente a qualquer música do gênero composta entre 1969 e
1979, terminando os parcos 39 minutos de disco de forma absolutamente perfeita.
Veredito
da Cripta
BlackHeaven é o melhor disco de Retro-Rock que escuto desde o fenomenal HisingenBlues, do Graveyard. Uma adição obrigatória à coleção
e qualquer fã de rock setentista que se preze e forte candidato a parte de cima
das listas de melhores de 2018.
TheSatanist,
disco dos poloneses do Behemoth de
2014, é cercado de uma história de fundo digna de filme, tendo inclusive
rendido a resenha mais visualizada e elogiada desse Blog (ler aqui).
Se o trabalho anterior de Nergal e
sua trupe já havia propiciado um ganho de território na cena metálica mundial, TheSatanist colocou o Behemoth
numa improvável condição de força a ser reconhecida comercialmente. Pudera,
trata-se de um dos trabalhos mais perfeitos da história recente do HeavyMetal. Com a banda tocando
em lugares melhores, em horários melhores dentro dos festivais e podendo
investir ainda mais na cenografia de palco, nada mais justo que Nergal optasse por registrar momentos
da turnê em alta definição.
Olá, você teria um minutinho de seu tempo para ouvir a palavra do cramulhão?
Apresentação
Como é comum no
material da NuclearBlast feito especialmente para
colecionadores, há um impressionante esmero no belo earbook. Uma coleção de fotos em preto e branco entremeadas por
impressos em papel manteiga remetem ao belo projeto gráfico do trabalho de
estúdio ao qual esse ao vivo faz referência. Os três disquinhos vêm encartados
na contracapa, em fundo aveludado com miolos de encaixe resistentes. A arte de
capa é bela e soturna, como esperado. Existem diversos outros formatos, mais
simples, para MesseNoire, mas imagino que o esmero se faça
presente em todos.
Messe Noire em suas várias faces
Blu-Ray/DVD
Menu
Belo,
e intuitivo, reflete o projeto gráfico do restante do pacote, permite a seleção
de músicas individualizadas ou que cada sessão seja reproduzida integralmente.
Tem como única falha o cursor seletor, que apenas ilumina levemente a opção
escolhida.
Imagem, Edição e Som
A teatralidade e
preocupação com a temática visual são parte integrante do show do Behemoth. Temos então profusão de
closes nas caras e bocas dos integrantes, cortes e tomadas que privilegiam os
belos e sombrios adereços de palco, tudo capturado em vários ângulos, em sua
grande maioria por câmeras de alta definição. A edição é ágil sem se tornar
esquizofrênica demais, com imagens em preto e branco se alternando com as
coloridas. A iluminação é parte do espetáculo, tudo muito bem pensado e
sombrio. As tomadas que privilegiam a plateia também são bem legais e até mesmo
a sobreposição de imagens, originalmente projetadas no telão, recurso que
geralmente repudio, aqui se encaixa, deixando um clima de desespero e
claustrofobia no ar. O som, em 5.1 ou estéreo, é perfeito, mantendo peso e
crueza aliados a uma qualidade cristalina, com boa captação da interação com o
animado público.
Performances e Repertório
A banda consegue
alternar entre a teatralidade, passividade solene e ferocidade num piscar de
olhos. Nergal é o mestre de
cerimônias e centro das atenções nessa missa negra, mas seus companheiros atuam
como excelentes coadjuvantes. Tecnicamente o quarteto funciona à perfeição e, a
despeito da complexidade do material de TheSatanist (que demanda por samplers e backingtracks aqui e
acolá) e da crueza do som ao vivo, a atmosfera está ali, intacta. O repertório
tem início com a execução do então recente trabalho na íntegra. Findada essa
parte, ainda temos uma bem escolhida sucessão de músicas do restante da carreira
dos poloneses, totalizando 15 faixas.
Extras
O
primeiro extra se chama LiveAssault, anunciado como um OfficialBootleg que traz 12 faixas tocadas ao vivo no festival BrutalAssault, em 2016. O repertório novamente é baseado na reprodução de
TheSatanist na íntegra, adicionando 3 faixas de outros discos no
encore. A qualidade de áudio e vídeo é bacana (nem merecia o epíteto Bootleg) e a despeito do repertório
repetido, é uma adição interessante para conferirmos os poloneses tocando em
outro ambiente para um público não unicamente deles.
O segundo extra se
chama CinematicArchive e engloba os seis videoclipes oficiais para músicas de TheSatanist, com destaque absoluto para os belos e funestos clipes de BlowYourTrumpetsGabriel e OFatherOSatanOSun!
CD
O Cd talvez seja o “ponto fraco” do
pacote. Não, a mixagem não é ruim, é até bem boa, diga-se, respeitando o
poderio da banda sem abandonar o som cristalino e colocando a plateia em
destaque quando necessário. Então qual seria o “problema” com a bolachinha? Bom
o “problema” é meramente conceitual, já que o disco traz somente as faixas do TheSatanist, o que deixa espaço vago que poderia ser muito bem ocupado
por algumas das músicas que aparecem no bis. mas o importante é saber que o
material funciona muito bem ao vivo, mesmo sem a impactante contraparte visual.
Veredito da Cripta
MesseNoire é um deleite audiovisual, que mostra bem o motivo do Behemoth ter conseguido galgar espaço
para além do restrito nicho do metal extremo. Grandes composições, executadas
com muito esmero e vigor e engrandecidas por um cuidado gráfico invejável. Item
obrigatório para os fãs dos poloneses.
NOTA: 10
Prós: Um pacote audiovisual que beira a
perfeição
Contras: Sendo chato, o Cd bem poderia
trazer algumas das músicas do encore
Classifique como: Black Metal, Death
Metal, Blackened Death metal
Para Fãs de: Vader, Dimmu Borgir, Emperor,
Watain, Ihsahn.
Décimo disco de inéditas
do combo liderado pelo hirsuto ZakkWylde, GrimmestHits vem ao
mundo pouco após o grandalhão ter retomado seu lugar ao lado do padrinho Ozzy. Também é o primeiro trabalho
pesado de Zakk após o reencontro com
seu lado acústico na apenas passável segunda parte do clássico BookOfShadows. Se considerarmos
que o BLS nunca primou por grande
versatilidade em seu som, fica a curiosidade se haveria influência desses dois
fatos em GrimmestHits.
Zakk e sua turma de inimigos do barbeador
TrampledDownBelow tem início
climático carregado pelo baixo de JohnDeServio, seguido de um ataque
guitarrístico à lá BlackSabbath. A voz de Zakk, com aqueles toques de inspiração explícita do madman, estão mais limpos do que em
outros tempos e o ótimo solo coroa um belo pontapé inicial. Toneladas de SouthernRock permeiam o disco, como em SeasonsOfFalter, mostrando que o BLS
soube enfim colocar um pouco de versatilidade em seu som consagrado. Som consagrado
do BLS é bem o que temos em Betrayal (ver vídeo), mas a produção,
arranjos e timbres trouxeram um algo à mais ao disco mesmo quando ele nada mais
faz que repetir fórmulas. Isso sem falar que mr. Wylde parece ter reencontrado sua melhor forma após ter deixado de
lado a biritagem, todos os solos do disco são absurdamente matadores!
O leitor atento já deve ter percebido que há algo de sorumbático em
todos os títulos das músicas, e talvez seja justamente esse senso de trevosidade
que tenha norteado o nome da bolachinha. Mas quem segue Zakk nas mídias sociais sabe bem o quanto o cara tem um espírito
galhofeiro, então até mesmo o impagável encarte, que traz o ceifador em
diversos momentos cotidianos hilários, faz troça com a temática sisuda. RoomOfNightmares (ver
vídeo) e A Love Unreal (que solo!) são
BLS tradicional em sua melhor forma,
e bem poderiam estar em Mafia ou BlessedHellride.
A
produção, capitaneada pelo próprio patrão, é seca e sombria, ainda que aposte
bastante numa bem-vinda dinâmica pouco comum aos trabalhos anteriores, casando
muito bem com o clima das composições. Um exemplo bem claro do que escrevi é Disbelief, que começa tipicamente BLS e dá uma bela caída semiacústica no
pré refrão, depois adicionando uma camada de guitarras que evoca até mesmo o
som Stoner clássico. Maturidade que
chama, né? IllusionsOfPeace
é outra pedrada com riff inspirado e talvez as apenas bacaninhas BuryYourSorrow e NothingLeftToSay devessem ter ficado de fora, até
para não diluir o poderio do restante do disco em quase uma hora de música, o
que é um bocadinho longo para esse tipo de som.
Veredito da Cripta
GrimmestHits
é uma surpreendente jornada por todo o espectro de influências musicais que
permeiam a carreira de ZakkWylde, temperada com o som típico do BlackLabelSociety, para
forjar um dos mais inspirados trabalhos da banda. Tivesse o disco encerrado com
umas três músicas a menos e estaríamos diante de um dos melhores do ano. Recomendo.
Banda ou projeto? Ainda
não ficou claro para ninguém, mas We
Sell the Dead (chamarei de WSTD
para economizar, se me permitirem) foi apresentado ao mundo como um “projeto multimídia
inspirado na era vitoriana, mas que transpõe a atmosfera daqueles tempos para
uma sonoridade moderna. Se Jack O Estripador
tivesse viajado no tempo para os dias modernos ele certamente entraria para uma
banda de heavymetal, e ela seria We Sell
The Dead...” baboseiras mil, o pressrelease mais me afastou inicialmente
do que causou curiosidade. De fato, o que temos aqui é um grupo formado por
gente de bandas conhecidas e variadas da cena, mas gente não tão famosa assim
para podermos chamar de supergrupo. São eles os suecos NiclasEngelin
(guitarrista do InFlames, Engel e Passenger), ApolloPapathanasio (voz, ex-Firewind,
atual SpiritualBeggars), JonasSlättung (baixo e voz, Drömriket) e GasLipstick (bateria,
ex-HIM). Se a mistura das bandas
originais dos membros do WSTD parece
estranha, matou a charada, é exatamente nessa estranheza que reside o charme
desse projeto, amparado pelos visuais do artista gráfico e game designer DanLind.
Quarteto sueco? Seria o ABBA?
Bora
Vender Defunto
A climática (e
cinemática) introdução TheBodyMarket, nos arremessa para o centro da viagem no tempo proposta no pressrelease, e então EchoesOfAnUglyPast aparece com seu riff totalmente Doom contrastando com uma sonoridade moderna (a produção pelo jeito
ficou ao encargo da própria banda) e a voz única de Apollo. O refrão é daqueles que gruda que nem chiclete na cachola e
é seguido por um baixo gorduroso e a bateria pesada de Gas. Foi a primeira coisa que escutei deles e definitivamente me
conquistou de cara. Excelente início.
Mais veloz que a faixa anterior, LeaveMeAlone mantém o peso e a cara única, se bem que talvez pudesse ser
explicada como algo que o TonyIommi pudesse assinar nos dias de hoje
se resolvesse prosseguir com uma nova versão do BlackSabbath. Imagine tem uma cara de trilha sonora
de musical, um dirigido por TimBurton mais especificamente, e a matadora
TurnItOver é um improvável Gothic-AOR que traz uma interessante
parceria vocal entre Jonas e Apollo.
Chuva, piano e um violão criam o clima para a sorumbática balada Too Cold To Touch, um momento de
absoluta calmaria no disco, é outra a trazer um bem encaixado dueto. Trust vem a seguir com a solenidade Doom de uma marcha fúnebre, e soa como
se o My Dying Bride tivesse tido um
filho com alguma banda finlandesa. Por um momento me veio o extinto Sentenced à mente. À primeira vista a
letra de Pale And Perfect pode indicar
uma daquelas breguices do HIM, mas
há de se notar um sutil toque de necrofilia no ar. SilentScream é a derradeira
das oito faixas, e é bem climática, com um dos melhores refrões do disco.
Veredito
da Cripta
E de onde eu menos esperava
saiu um disco simples, único e viciante. Difícil dizer se há conteúdo para se
levar o We Sell The Dead para além
desse álbum de estreia, mas se ficar só nele, a junção dos suecos já terá
valido à pena.