quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Kreator - Phantom Antichrist (2012)


Uma Nova E promissora Era para o Kreator

Prólogo –  E o Thrash Metal toma a Alemanha
Em uma época anterior a globalização de informações imediata que a internet proporciona, era muito difícil ficar antenado com as novas tendências musicais ao redor do mundo. Quiçá em se tratando de novas tendências do underground do rock pesado. Embora eu não tenha vivido a plenitude dessa época, já escutei muitas histórias de como a troca de preciosidades via as obsoletas fitas k-7 proporcionou o surgimento de fenômenos musicais ao redor do globo, fomentando cenas que viviam a margem da divulgação em rádio e televisão.
Em alguns momentos da história da música, tal como na biologia chamamos de convergência adaptativa, ocorreu o fenômeno do rock pesado evoluir na mesma direção em partes diferentes do globo, sem que seja exatamente possível comprovar ou rastrear que tenha havido influência mútua das cenas.
Um exemplo clássico foi o surgimento da cena Thrash Metal. O subestilo, um dos mais populares dentro do metal, pode ser explicado de maneira simplista como uma mistura do novo metal da NWOBHM com influências punk. Geralmente três são as bandas citadas como influências para o surgimento do estilo, as britânicas Motorhead e Venom (essa seria também “culpada” pelo surgimento do Black Metal) e os alemães do Accept. Muitas bandas hoje relacionadas ao estilo na época praticavam um som um tanto menos rápido e pesado, e começaram a tender para esse caminho mais ou menos por volta de 1982.
Se nos Estados Unidos a cena tinha início com Overkill, Metal Church e Metallica como virtuais pioneiros, na Alemanha o mesmo ocorreria com Sodom, Holy Moses, Tankard, Destruction e uma tal de Tormentor.

Destruction, Holy Moses, Sodom e Tankard - Metal com Chucrute

Essa última assinaria seu primeiro contrato com o mítico selo Noise Records em 1985. Como existiam muitas bandas atendendo por Tormentor, o selo os orientou a escolher um novo epíteto. Nascia então a marca mais popular do Thrash Teutônico – o nome escolhido, Kreator.

O Kreator lançou seu primeiro álbum ainda em 1985, e seu som extremamente virulento levou a banda a se tornar a mais popular da cena Thrash alemã. A fúria não era marca registrada apenas do som, estando estampada também em cores vivas nas letras, o que levou a alguns meios da imprensa especializada a cunhar o termo Hate Metal para definir o Kreator.

Miland "Mille" Petrozza e seus cupinchas
A popularidade do Kreator crescia disco a disco, até que chegou a década de 1990. Com o metal em baixa, o líder, vocalista, guitarrista e principal compositor da banda, Mille Petrozza, resolveu que era hora de mudar. E em 1992, com Renewal, a banda iniciou um período experimental, que culminaria no quase gótico Endorama (1999 – ver clip), que para os fãs mais radicais, sepultaria de vez a credibilidade da banda.


Apesar de desacreditado, o Kreator lançou em 2001 um de seus melhores trabalhos, Violent Revolution (ver clip), trazendo de volta seu Thrash Metal com um bem vindo toque de um heavy metal tradicional. Prontamente o Kretor foi reerguido dos mortos por quase todo fã de metal e a banda experimentou então um segundo boom de popularidade, contando com uma tríade de grandes discos de estúdio (compõe a tríade Enemy Of God e Hordes Of Chaos) que seguiam praticamente a mesma estética musical.


Mille Petrozza decidiu então que era hora de mudar de novo. Temendo a estagnação, e para desespero dos fãs mais radicais, foi anunciado que o vindouro Phantom Antichrist seria o início de uma nova era para o Kreator...



Conceito – Um Inimigo Imaginário

O conceito para o título do novo disco é bastante interessante. Ao contrário do que aparenta no primeiro contato, não se trata de uma referência satânica. O Phantom Antichrist de Mille foi inspirado nas suposições de armas de destruição em massa que o governo Norte-Americano utilizou como pretexto para expressar seu belicismo de encontro à soberania de países do Oriente Médio, mas pode ser qualquer outra coisa. O Phantom Antichrist seria uma espécie de bode expiatório, uma resposta malignamente adulta aos amigos imaginários da infância - um inimigo (não necessariamente um ser, pode ser uma situação) irreal que mentalizamos com tanta força que quase se torna verdadeiro em nossas vidas, e que criamos apenas como exercício de negação de nossas próprias fraquezas ou pretexto para tentar volatilizar a moral em prol de nossas segundas intenções.

A arte de capa, por Wes Benscoter (Dio, Black Sabbath, Slayer) foi toda feita por pinturas manuais, bem vintage, como homenagem às capas antigas de bandas de Heavy Metal. A imagem que aparece ao topo da resenha é relativa à edição limitada, que além do cd contém um DVD bônus, e que será aqui analisada.  A arte original segue abaixo.

A bizarra arte de capa original
Hate Metal Servido com Molho Épico
Os fãs temerosos da suposta nova sonoridade do Kreator devem ter ficado ainda mais temerosos ao ouvir os cânticos etéreos acamados por cordas do início da introdução instrumental Mars Mantra.

Mas acredito que todo temor deva ter se dissipado ao começo da faixa título, absolutamente pesada e muito inspirada (ver vídeo abaixo). Nela já há sinais da intenção da banda, com um equilíbrio do peso com um aporte maior de melodias e uma dose de técnica visivelmente mais apurada que o padrão da banda nas passagens instrumentais.


A intenção declarada de Mille foi adaptar a sonoridade do Kreator a uma estética épica e grandiosa. Isso sem perder a essência do som da banda. Objetivo plenamente atingido, graças em parte à produção do renomado Jens Bogren (Opeth, katatonia, Symphony X), responsável pelo melhor som que o Kreator já conseguiu em estúdio. As dobras de guitarra a lá Iron Maiden (uma das maiores influências da banda) foram levadas a um novo patamar, como podemos ouvir em pancadas como Death To The Wolrd, Victory Will Come e Civilisation Collapse (com clima marcial, uma das melhores) – cortesia do entrosamento perfeito entre o dono da banda e o excelente guitarrista finlandês Sami Yli-Sirnio, na banda desde 2001. Os solos estão muito mais elaborados e garantem momentos brilhantes em todas as faixas.
A bateria do veterano Ventor continua com sua pegada old school, e Christian Giesler trabalha suas linhas de baixo num meio termo entre o funcional e o inventivo.

Kreator 2012
Mas o grande diferencial ficou evidenciado no trabalho de vozes imaginado por Mille e colocado em prática por culpa do produtor. Não, não fique com medo, Mille não passou a cantar de maneira operística. O baixinho continua esbanjando fúria com sua voz meio esganiçada e forte. A diferença é que dessa vez ele foi levado a trabalhar com mais afinco as linhas melódicas, de uma forma que as trouxe mais próximas aos trabalhos de heavy metal tradicional na maioria dos casos, vide The Few, The Proud, The Broken e Until Our Paths Cross Again.
Talvez o maior choque fique por conta da ótima From Flood Into Fire, com seu início quase chupado do Amon Amarth (de Embrace Of The Endless Ocean) e que traz um clima absolutamente Power metal, com refrão possuindo um coro de vozes que em muito se assemelha as bandas mais pesadas do combalido estilo. Algo que poderia bem ser assinado pelo Blind Guardian de início de carreira, por exemplo. O trecho em que o produtor encoraja Mille a executar, junto ao resto da banda, os backing vocals dessa faixa, e o visível constrangimento no rosto do líder da banda garantem um dos pontos altos do documentário que consta no DVD bônus.

Saldo Final
Acredito piamente que a maioria dos fãs do Kreator, e de metal em geral, aprovarão sem ressalvas o novo direcionamento da banda. Ao contrario do que aconteceu na reviravolta dada pelo Kreator nos anos 1990, as novas inspirações foram buscadas por Mille nas raízes do próprio estilo e pouco ou nada tem de polêmicas. Sem contar que poucas vezes a banda conseguiu reunir sua já conhecida fúria com um rol de músicas tão inspiradas e memoráveis.

Com o final do ano chegando, a única surpresa negativa que esse Phantom Antichrist poderá proporcionar é a de não estar presente em 9 de cada 10 listas de melhores discos de 2012.

Na minha lista, ele já está.

NOTA: 9

DVD – Enfim um Bônus de Verdade!
O DVD bônus é dividido em duas partes. A primeira, intitulada Conquerors Of Ice, nada mais é que um making of sobre a gravação do disco, com duração de aproximadamente 20 minutos. Muito bem produzido, traz detalhes desde a elaboração do nome do disco (foi daí que tirei a explicação contida na resenha), até a masterização e elaboração da arte gráfica. Misturando imagens da gravação em estúdio com entrevistas com Sami, Mille, o produtor Jens Bogren e o artista gráfico Wes Benscoter, trata-se de um material bastante interessante e que merece uma espiada.

Já a segunda parte do DVD, intitulada Harvesting the Grapes of Horror, traz um mix dos últimos dois shows do Kreator no Wacken Open Air (2008 e 2011), compilados em 14 faixas (mais duas intros) e totalizando uma hora de uma apresentação vigorosa e inspirada da banda. O som é de uma qualidade excepcional, por vezes dá a impressão de se tratar de um trabalho refeito em estúdio, tamanha a perfeição da banda na execução de vários de seus hinos. O vídeo é todo apresentado em sépia, mas numa qualidade bastante superior a comumente apresentada em shows embutidos como bônus de algum lançamento em áudio. A ressaltar a monstruosa recepção do público à banda, que dá a impressão de tratar-se de um show só do Kreator e não de uma apresentação em um festival, além do breve, mas inspirado discurso anti-racismo do sempre anti-tudo Mille.

Um showzaço que coroa dignamente um excelente material bônus de um não menos inspirado CD.


Ficha Técnica
Banda (Nacionalidade): Kreator (ALE)
Título (ano de lançamento): Phantom Antichrist (2012)
Mídia: CD + DVD (Presente na Edição Limitada)
Gravadora: Nuclear Blast (Importado)
Faixas: 10 (show do DVD com 16 faixas)
Duração: CD  – 43’  DVD – 80’
 Rotule como: Thrash Metal
Indicado para: Fãs de Thrash Metal e eventualmente, fãs de Heavy e Power Metal que não tenham medo do escuro.
Passe longe se: Não curtir influências de metal tradicional no Thrash.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Saxon - Heavy Metal Thunder Live - Eagles Over Wacken (2012)




Uma Bem Vinda Overdose Saxônica

Prólogo: Um Orgulhoso Sobrevivente da NWOBHM

A New Wave Of British Heavy Metal (ou, para facilitar, NWOBHM) talvez seja a cena musical mais incensada dentro da história do Metal. Ela marcou o surgimento (e em alguns casos, ressurgimento) de toda uma geração de bandas que não só reergueu o metal, praticamente extinto ao final dos anos 1970 pela disco music e pelo punk rock, como o trouxe de volta á vida com uma energia nunca vista antes, sob uma nova estética tanto visual como musical. Esse soerguimento se espalhou pelo mundo, e várias bandas surgidas em outros países acabam sendo relacionadas por tabela ao movimento (um caso clássico é o dos americanos do Riot).

O movimento lançaria o metal numa espiral crescente de popularidade que culminaria nos excessos do hair metal (ou Hard Farofa) do final dos anos 1980 (vide Motley Crue, Cinderella, Ratt, Poison, Guns And Roses...). Pouco depois o metal novamente desceria ao porão, chutado do mainstream pelo emergente grunge.


Apesar de sua importância histórica, a NWOBHM curiosamente viu poucos de seus integrantes sobreviverem à década de 1980. Bandas promissoras como Angel Witch, Diamond Head, Samson, Grim Reaper e Satan logo pereceriam (salvo algumas tentativas de shows de retorno esporádicas). Outras como Tygers Of Pang Tang, Venom ou Demon sobreviveriam aos trancos e barrancos, sempre relegadas a um status de curiosidade Cult, como fósseis vivos musicais.




NWOBHM (Sentido Horário - começando zero hora) - Grim Reaper, Venom, Tygers Of Pan Tang e Angel Witch 

Se considerarmos que Motorhead e Judas Priest nasceram cedo demais para serem incluídas na conta da NWOBHM, sobram dois representantes realmente bem sucedidos daquela cena: o gigantesco Def Leppard (banda que nem gosta de ser relacionada ao período) e a maior banda de metal em todos os tempos: o Iron Maiden.

Mas há um caso especial, de uma banda que sobreviveu àquela cena sem nunca ter se tornado gigante, mas sem também nunca também ter passado perto da ameaça de extinção. E essa banda é o Saxon.

O Desnutrido Saxon na década de 1980
O Saxon seria uma das primeiras bandas daquela cena a ver a luz do dia sob a forma de um LP – no caso, auto-intitulado e lançado em 1979. No início dos anos 1980 a banda lançaria uma série de discos clássicos, com uma mistura do novo heavy metal de então (hoje chamado Metal Tradicional) com a malicia do rock pesado da década anterior.

A partir de 1984, quando lançou seu maior sucesso comercial, Crusader, a banda passaria a apresentar uma progressiva americanização de seu som, culminando no achincalhado Destiny (1988), que se perdia entre o metal e o hard farofa em voga na época.


1988 - Saxon compra MUITO laquê

Tendo desagradado a gregos e troianos e vendo o som pasteurizado do final dos anos 1980 que tanto perseguira sucumbir ao grunge, a banda não teve opção a não ser resgatar sua identidade, o que aconteceu com Solid Ball Of Rock (1990).
Mas foi só algum tempo depois, mais especificamente com Unleash The Beast (1997), que a banda de fato se reergueu. Se aproveitando do boom de popularidade do Power Metal na Europa no meio da década de 1990, a banda revigorou seu som, acrescentando ao mesmo características daquele subestilo, inclusive nas letras, que passariam das motos de outrora aos recém incensados dragões e mitologia.
 Desde então, contando com uma certa estabilidade em sua formação, e com uma reputação renovada, o Saxon voltou a se reconhecido também por uma característica que nunca havia deixado a banda, mesmo em seus piores momentos: a de ser uma força impressionante ao vivo. Tive a oportunidade de assistir os britânicos ao vivo apenas uma vez, na derradeira edição do Monsters Of Rock, em 1998, e posso garantir que poucas bandas de metal fazem um show tão empolgante.


Por isso, não posso deixar de ficar feliz em resenhar esse novo lançamento, um Box que compila apresentações do Saxon em várias edições do maior festival de Heavy Metal do mundo, o alemão Wacken Open Air.



Saxon e Wacken – um antigo caso de amor

Uma das bandas favoritas da equipe que organiza o Wacken Open Air, a banda tem sido presença constante no festival desde 2001. Aliás, a edição daquele ano integra a atração principal do ótimo Box Saxon Chronicles, lançado em 2003.

De lá para cá a banda repetiu a dose no Wacken nas edições de 2004, 2007 e 2009. E há rumores que já estão escalados para a edição de 2013, marcando a turnê de um novo disco.



A sintonia é tanta que a banda promete sempre (o que pode ser visto em algum ponto do DVD aqui resenhado) que quando for encerrar oficialmente sua carreira o ponto final será um show especial no festival.


Wacken - Cast de 2004 com Saxon em destaque

Para comemorar o sucesso dessa parceria, o Saxon lançou o Box Heavy Metal Thunder, em dois formatos. Uma edição limitada que traz os três shows na íntegra, em três DVDS separados, além de um show da turnê atual em dois cds. Esse Box recheado ainda conta com 10 vales que podem ser trocados por ingressos de qualquer show da turnê atual (e das futuras) do Saxon.



A outra versão, aqui analisada, será a “econômica”, idêntica a lançada no Brasil. Nela temos um DVD compilando o melhor das três apresentações no Wacken supracitadas, além de dois CDs contendo uma apresentação em Glasgow.




DVD – Eagles Over Wacken

O DVD – Eagles Over Wacken – é o principal item do pacote.

Pudera.

O mesmo traz nada mais nada menos que cerca de três horas de Saxon, encapsuladas em 30 faixas retiradas das participações da banda no festival nos anos 2004, 2007 e 2009.

As 30 faixas, por sinal, retratam praticamente todas as fases da carreira da banda. Salvo engano, apenas Destiny (1988) e Forever Free (1992), dois dos poucos discos fracos do Saxon, não estão representados no repertório. As músicas são apresentadas em seqüência, como se fossem parte de uma só apresentação e a diferença na qualidade de som e imagem entre as três gravações diferentes é pequena o suficiente para garantir a fluidez da artimanha. Não fossem as legendas que aparecem ao início de cada faixa, dando o título e ano em que a mesma foi gravada, provavelmente muitos não notariam tratar-se de um apanhado de shows diferentes.


De faixas obrigatórias como 747 (Strangers In The Night), Crusader e Wheels Of Steel; passando por destaques da fase mais recente da banda, como Killing Ground, Dogs Of War, Metalhead, Attila The Hun e Unleash The Beast – tem de quase tudo no repertório. E deu até mesmo para resgatar faixas “perdidas” como To Hell And Back Again, The Bands Played On, Rock The Nations, The Eagle Has Landed e Stallions of The Highway.  É o tipo de repertório que faz com que tenhamos raiva da estratégia de bandas como o Iron Maiden e Deep Purple, que parecem ter orgulho em ignorar boa parte de suas ricas discografias e em torturar os fãs com as mesmas músicas de sempre em seus shows e lançamentos ao vivo. Colocarei ao longo dessa resenha o link de algumas das músicas como apresentadas no DVD.




O som apresentado ao longo do DVD é muito bem gravado. Dado a qualidade tradicionalmente mais baixa do som em eventos que contam com diversas atrações no mesmo dia, pode-se dizer que esse fator não comprometeu em nada as gravações contidas no DVD. A ressaltar apenas dois pequeninos problemas: a mixagem deixou o poderoso vocal de Biff Byford um pouco alto demais e pecou ao deixar a participação do público quase imperceptível no modo 2.0. No 5.1 isso melhora um bocado, mas ainda deixa a impressão que podiam ter captado a audiência melhor.




Em relação ao vídeo, aí sim uma ressalva. A qualidade não é exatamente ruim, mas em se tratando que estamos entrando com os dois pés na era da alta definição, as imagens com tomadas por vezes granuladas, por vezes embaçadas dão uma cara absolutamente obsoleta a apresentação. E nem podemos dizer ser culpa da época em que foram capturadas as mesmas, já que a apresentação mais antiga aqui data de 2004. Outro dia analisei aqui na Cripta o Blu-Ray do Rory Gallagher e o mesmo foi gravado em 1974, contendo qualidade de imagem por vezes superior à apresentada em Eagles Over Wacken. Para resumir: a qualidade de imagem aqui é por vezes inferior à apresentada pela banda em Saxon Chronichles, filmado no Wacken de 2001. Mas nada que estrague a diversão.




Isso porque a banda está, como sempre, afiadíssima no palco.


Biff Byford, embora pareça cada vez mais uma velha saída de alguma comédia do Monty Python, continua com um gogó privilegiado. Raramente dá aquele “migué” que contemporâneos como Bruce Dickinson usam à exaustão, de afastar o microfone da boca, ou de colocar todos os refrões para o público cantar. Em alguns momentos, chega a assustar a potência e alcance da voz do quase sexagenário Biff. Isso sem contar a sempre contagiante presença de palco do grandalhão e de seu visual totalmente true. Um ícone absolutamente subestimado da história do metal.


A dupla de guitarristas do Saxon desde Unleash The BeastPaul Quinn e Doug Scarratt – é corretíssima. Se não prima pela técnica, mantém viva a tradição da banda de misturar as guitarras dobradas típicas da NWOBHM com uma pegada mais rock and roll. Aliás, talvez um dos grandes diferenciais do Saxon seja exatamente esse clima rock misturado ao metal.

O baixista Nibbs Carter, com a banda desde o renascimento da mesma para o metal, o que ocorreu em 1990, com Solid Ball Of Rock, é bem acima da média dos baixistas tradicionalmente encontrados em bandas do estilo. Mas em nenhum momento compromete sua vigorosa performance com exibicionismo barato, jogando sempre “pro time”.

Ah, e Nigel Glockler, esse não necessita de apresentações. Um dos melhores bateristas do estilo na década de 1980, desde seu retorno parece ter resgatado muito da pegada do Saxon ao vivo. Ah, em algumas músicas de 2004, Fritz Randow também toca e não faz feio.
De resto, cabe ressaltar o clima sempre empolgado do público do Wacken, além da presença de eventuais pirotecnias que ajudam a manter interesse na longa jornada que é assistir o DVD de ponta a ponta.

O DVD traz ainda como extras um Behind The Scenes bacaninha e um inútil Slideshow.



CDS – Glasgow Live

Completando o box, temos dois cds que trazem uma apresentação capturada na íntegra em 2011, na turnê do disco mais recente da banda, o bom Call To Arms (2011).



Com excelente qualidade de gravação, posso repetir aqui todos os adjetivos feitos à performance da banda no DVD resenhado acima sem medo de errar. A grande diferença aqui é que não temos 30 faixas e sim 23 (mais uma introdução), que além de trazer um bom, ainda que menos abrangente, apanhado da carreira da banda, traz três faixas do novo trabalho, como a excelente Hammer Of The Gods, que soa ainda melhor ao vivo.


Saxon nos dias de hoje

Talvez Glasgow Live empalideça um pouco se comparado ao clássico ao vivo The Eagle Has Landed, mas se compráramos esse registro às tentativas frustradas de capturar a banda ao vivo, feitas na década de 1990 e 2000 através dos magrinhos Eagle Has Landed II e III, temos aqui um item que se tornaria obrigatório a qualquer fã da banda, mesmo que lançado em separado do recheadíssimo DVD.


Saldo Final

O Saxon anda se notabilizando por caprichar no conteúdo de seus lançamentos em DVD, e esse Heavy Metal Thunder não deixa mentir.

Mesmo se considerarmos que a versão aqui analisada não é a mais completa, temos aqui um apanhado considerável de material de qualidade (ainda que a qualidade seja maior em termos de som do que imagem).
E esse extenso material não é indicado somente para os iniciados, pois serve também como um excelente primeiro contato para aqueles que porventura tenham curiosidade de conhecer o mundo dessa lenda do metal britânico.

Em suma, uma agradável overdose que não fará mal a ninguém.



NOTA: 9


Ficha Técnica

Banda (Nacionalidade): Saxon (ING)
Título (ano de lançamento): Heavy Metal Thunder Live (2012)

Mídia: DVD + 2CD
Gravadora: EMI (Importado)
Faixas: DVD - 30; CD 1 – 15; CD 2 - 9
Duração: DVD - 177’ ; 2CD – 115’

Rotule como: Heavy Metal

Indicado para: Fãs de Heavy Metal dos anos 1980, fãs de Power Metal.

Passe longe se: Achar esse lance de couro, jeans e motocicletas datado.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

UFO - Seven Deadly (2012)




O NOVO VOO DO OBJETO VOADOR JURÁSSICO

Prólogo–As muitas aparições do UFO


Na ativa (ainda que com alguns pequenos hiatos temporais) desde 1969, quando ainda atendia pelo nome Hocus Pocus, o UFO é tido para muitos como sendo uma daquelas bandas da segunda divisão do hard/heavy britânico.


Uma tremenda injustiça. Após um início algo confuso, com dois discos que tendiam para um space-rock parente daquele feito pelos conterrâneos malucos do Hawkwind, a banda teve a seu favor justamente uma série de imprevistos que poderiam ser até chamados de “onda de azar”, não tivessem culminado em algo tão improvavelmente fortuito quanto ganhar na megasena.


O episódio começou assim: início de 1972, a banda tinha um guitarrista novo, Larry Wallis, em substituição a Mick Bolton. Os dois primeiros discos da banda só haviam vendido algo em dois lugares, na Alemanha e no Japão. A banda precisava sair do Reino Unido e pegar a estrada. Wallis dá no pé. Recrutam então o bom Bernie Marsden (mais tarde, ele brilharia no Whitesnake). Só que a banda era uma das mais barra-pesadas na época, e o novinho Bernie não estava agüentando o tranco de goró e outras muitas cositas mais...Bernie começou a ter comportamento evasivo, sumia até a hora dos shows, fazia o show e sumia de novo. Numa importante turnê pela Alemanha, o cara simplesmente desapareceu. As versões que são encontradas para essa parte da história são as mais diversas possíveis, mas o fato é que eles tinham poucas horas para fazer um show na Alemanha e não tinham guitarrista.


UFO, em 1972,

Mas Phil Mogg, vocalista e líder da banda, lembrou-se de um detalhe: o próprio Bernie vinha elogiando diariamente o guitarrista da então desconhecida banda de abertura dos shows – uma tal de Scorpions. O guitarrista, um alto e magrelo moleque de 16 anos, chamado Michael Schenker, era claramente um prodígio, qualquer um que batesse os olhos no garoto sabia que não havia nada além de sucesso em seu caminho. Michael era também irmão caçula do líder da banda, Rudolph Schenker. Com a benção do irmão mais velho, Phil ensina em um par de horas todo o repertório básico do UFO – o garoto sobe ao palco e simplesmente arrasa. A partir dali, um novo mundo se abriria ao UFO.


Sob a batuta de um dos maiores (e mais excêntricos) guitarristas de todos os tempos, o UFO lançaria uma penca de álbuns obrigatórios em seqüência, culminando no que considero o melhor disco ao vivo em todos os tempos, a pérola Strangers In The Night, de 1978. Abaixo, uma amostra do poder de fogo da banda ao vivo:




O que se seguiu talvez tenha diminuído a importância da banda na história do rock: O doido de pedra do Michael Schenker, que para fugir da acapachante timidez se afunda cada vez mais na birita, briga com Mogg pela enésima vez e abandona a banda. Os caras então seguiram em frente, lançando bons discos e fazendo shows concorridos, mas não sobreviveram à falta que o guitar hero fazia – tanto musicalmente quanto visualmente – Schenker era uma espécie de sex-simbol na época.

Michael Piroca-das-ideias Schenker
Pouco a pouco a banda foi sucumbindo aos excessos (Phil Mogg e o baixista Pete Way são tido como dois dos caras mais podreiras da cena rocker britânica) e foi sumindo do mapa.


Se alternaram alguns períodos de inatividade com outros de retorno, ambos sempre ignorados pela grande mídia. Até que Micahel Schenker retornou, para o clássico Walk On Water (1994), excursionando e gravando ainda mais 2 discos antes de fazer mais algumas maluquices e fugir em definitivo da banda. Só que dessa vez o sucesso desse retorno insuflou Phil Mogg e os outros de uma confiança e brios vorazes – era hora de se livrar do fantasma de Schenker!


Propaganda Japa sobre o miraculoso (e breve) retorno da formação clássica

Para tanto, recrutaram um improvável grande fã da banda, o virtuose americano Vinnie Moore, outrora rotulado como mais um dos Malmsteen-wannabes que os anos 1980 produziram.

Vinnie Malmsteen? Ou seria Yngwie Moore?
Para surpresa de todos, a parceria funcionou logo de cara – gravaram um disco muito bom, You Are Here (2004), e um ao vivo que, se não chega perto de rivalizar com o Strangers In The Night, ao menos mostra que a banda, ao contrário da maioria de seus contemporâneos, ainda manda muito bem ao vivo (ver link).


De lá para cá, a banda vem atravessando uma fase bastante criativa, lançando discos num intervalo de tempo bem inferior ao padrão das bandas com tempo de rodagem semelhante. Só que parte dos fãs não consegue esquecer a fase áurea e vem torcendo o nariz para o fato da banda vir cada vez mais incorporando traços de blues rock a suas composições. Pesa também o fato da banda não contar mais com um de seus membros clássicos, o doidão Pete Way, que vem há pelo menos 4 anos lidando com problemas seriíssimos no fígado e teve que deixar de lado a proximidade com as tentações mundanas.


Pouco mais de dois anos depois do lançamento do bom The Visitor, eis que a banda lança seu segundo disco depois da saída de Pete, intitulado Seven Deadly.



Rumo aos pecados capitais

Bem, a capa do disco é algo que causa controvérsia – alguns acham divertida e diferente, outros simplesmente acham detestável. A caveira mexicana de sombreiro no cenário lisérgico regado à mescalina repleto de cores fortes me lembrou muito alguma capa do OingoBoingo...esperei desde então que o conteúdo musical fosse mais inspirado que isso.


Se você é um daqueles que torceram o nariz para as incursões da banda no blues rock, logo de cara é melhor desistir de embarcar nessa viagem. Fight Night, com sua letra fazendo referência a paixão mexicana (olha o México aí de novo) pela luta livre galhofeira, é um blues rock divertido e nada original.Phil Mogg continua ótimo, com sua voz que rescende a whiskey e cigarro e suas observações sempre sarcásticas sobre situações cotidianas permeando as letras. Certamente um dos poucos vocalistas de sua geração que faz justiça ao próprio legado.


Phil Mogg dedica a próxima música ao criador do viagra...

Wonderland (ver link) é mais acelerada, trazendo riffs e solos (ótimos, por sinal) que remetem um pouco mais à fase Schenker da banda. Ah, os backing vocals aqui também lembram essa fase. Outra bola dentro!


Um peso mais moderno e repleto de groove pode ser encontrado em Mojo town. Me lembrou o estilo do Black Country Communion, ou seja, poderia bem ser algo composto pelo Glenn Hughes, o que não é nada mal! Confesso que os backing vocals femininos de cabaré não me agradam em nada e aqui comecei a me dar conta que possivelmente seriam uma constante no restante do disco. Os mesmos dão as caras na bluesy falsa balada Angel Station, que carece de um pouco mais de inspiração.

Year Of The Gun é bem legal e poderia estar no repertório de algum disco da banda no início dos anos 1980 ou até mesmo no excelente e mais recente Walk On Water, com seu ar despojado de saloon de western barato.


Mais uma que poderia fazer companhia às músicas de Walk On Water, em estilo, mas não em qualidade, Last Stone Rider é mais do mesmo, e ainda tem os backing chatinhos para piorar. Um interessante solo do monstro Vinnie Moore anima um pouco a coisa. Cabe ressaltar que o cara é de uma versatilidade gritante – ora soa como se quisesse fazer uma oferenda ritual ao fantasma de Michael Schenker, ora soa bluesy, ora totalmente fusion – mas sempre com classe e eventualmente com criatividade acima da média.


Objeto Voador Geriátrico

Mais uma com os dois pés fincados no Blues Rock, Steal Yourself apenas cumpre tabela. A faixa seguinte, Burn Your House Down (ver link), pode ser apontada como um dos destaques do disco, com uma letra bacaninha, clima algo soturno e boa performance do dono da banda. Para quem não sabe, Phil Mogg tradicionalmente só compõe as letra e melodias no exato momento de gravar a voz, quase como um repentista do rock. Eventualmente isso causa atritos com produtores, mas costuma trazer também resultados interessantes. Há de se destacar também os ótimos solos de Mr. Moore aqui, certamente seu ápice guitarrístico no disco.


A absolutamente Southern Rock The Fear mantém o nível alto da faixa anterior, apesar do terrível backing vocal espreitando, contando com uma gaita quase constante que traz um clima meio empoeirado à música. Outro solo inspirado de Vinnie Moore, com slide guitar, dessa vez lembrando algo que Rictchie Blackmore poderia ter assinado antes de abandonar o rock.


E se a faixa anterior encontrou seu tempero com uma gaita, aqui em Waving Goodbye quem faz as vezes é um hammond, num fechamento de disco digno com mais uma demonstração da qualidade dos solos melódicos do “novo” integrante, que se estendem do meio para o fim da música.


Saldo Final

Atravessando um de seus períodos mais prolíficos e criativos, o UFO parece não dar a mínima para o envelhecimento musical das bandas de sua geração. Definitivamente Seven Deadly não soa como um bando de velhinhos numa festa de asilo.

Se você não se convenceu de que Vinnie Moore foi uma boa escolha de Phil Mogg para continuar sua saga, então não será esse disco que irá mudar sua cabeça, já que o que ouvimos aqui não é muito diferente do que a banda produziu desde que o guitarrista trouxe o UFO de volta ao mapa em You Are Here (2004). E quanto a ausência de Pete Way, ela certamente é mais sentida ao vivo do que em estúdio. Já o batera original, Andy Parker, dá conta do recado sem maiores problemas.


Seven Deadly é um disco legal, de uma banda que, embora esteja velha demais para se importar em mudar as regras do jogo, ainda tem vigor suficiente para cavalgar para longe da estrada da aposentadoria.


NOTA:8


Ficha Técnica

Banda (Nacionalidade): UFO (ING)
Título (ano de lançamento): Seven Deadly (2012)
Mídia: CD
Gravadora: SPV Steamhammer (Importado)
Faixas: 10
Duração: 47’

Faixas:
1. Fight Night; 2. Wonderland; 3. Mojo Town; 4. Angel Station; 5. Year Of The Gun; 6. The Last Stone Rider; 7. Steal Yourself; 8. Burn Your House Down; 9. The Fear; 10. Waving Goodbye;

Rotule como: Hard Rock, Heavy Rock, Classic Rock, Blues Rock

Indicado para: Fãs de um bom classic/blues rock.

Passe longe se: for uma viúva do Michael Schenker.