quinta-feira, 18 de junho de 2015

Kamelot – Haven: Limited Edition (2Cds – 2015)

Kamelot - Haven (2015)
De volta aos Trilhos
Por Trevas

Ah, o Metal Melódico

Os anos 1990 foram estranhos para o Heavy Metal. Após resvalar no mainstream na segunda metade da década anterior, o estilo acabou chafurdando mais e mais, relegado a catar poeira nas estantes das grandes lojas. Até mesmo as revistas especializadas passaram a relegar os lançamentos mais tradicionais do estilo a segundo plano. Aliás, o metal tradicional praticamente inexistiu nessa década. Como que para sobreviver às intempéries, o Metal começou a apostar numa evolução curiosa. Subgêneros que já existiam partiram para uma diferenciação quase caricata, pegando alguns maneirismos do estilo e potencializando ao máximo.  Em uma ponta, o metal se tornou ainda mais extremo, com o Death Metal e o Black Metal e suas vertentes. Na outra ponta, como uma bizarra raça de antípodas, o estilo pegou suas características mais espalhafatosas, naquele que considero o pior dos filhos bastardos do Deus Metal: o Power Metal Melódico, ou simplesmente Metal Melódico. Músicas alegrinhas, bumbo duplo em profusão sem que isso fosse sinônimo de peso, vocalistas cantando como menininhas virgens, solos neoclássicos e letras supostamente épicas que violavam a mitologia capa e espada do metal mais tradicional como a autora o Crepúsculo o fez com a mitologia vampiresca. Um pesadelo!

Dizem que Rhapsody é usado como tortura em Guantanamo...seriam eles tão cruéis assim?
Mas sou partidário da teoria de que todas as vertentes do rock pesado tem o joio e o trigo. Tal qual acontece com o Nu Metal, ainda que o todo da cena passe a ideia de mediocridade absoluta, há de se ter algumas bandas que valham à pena. E no infame Metal Melódico, se me pedirem para escalar um grande ponto fora da curva, destacaria os americanos do Kamelot.

Não que eu beije o chão onde os caras pisaram, não. O início da banda foi absolutamente tétrico, Eternity (1995) e Dominion (1997) eram pavorosamente arranjados e contavam com um vocalista que era ruim até mesmo para os padrões daqueles tempos melódicos (Mark Vanderbilt). O jogo começou a mudar com a entrada de Roy Khan. O exímio norueguês havia se destacado com o Conception, banda que fazia um metal à frente do seu tempo. Roy possui um estilo bastante peculiar, algo na escola de Geoff Tate, com um poder de interpretação bem acima da média e raramente apelando para agudinhos desnecessários.

Khan, antes de pirar na batatinha...
Com Roy o início também não foi dos melhores, Siege Perilous (1998) ainda era mais do mesmo. O disco seguinte, Fourth Legacy (1999), além de apresentar uma produção muito melhor que os anteriores, já começava a mostrar ao mundo o verdadeiro Kamelot: o power melódico se misturava em alguns momentos a elementos bem modernos, a arranjos sinfônicos bem trabalhados e até mesmo meio dark. Essa característica ficou mais clara no ótimo Karma (2001). A banda passou então a chamar a atenção para além da bolha do metal melódico. Epica (de 2003, disco que deu o nome à banda holandesa), desequilibrou um pouco, pendendo para o lado mais épico (dã), mas o fenomenal Black Halo (2005), com sua modernidade e aura gótica aliados ao estilo mais tradicional, se tornou um marco e um dos melhores discos de metal de seu tempo.


Dali para a frente, infelizmente a banda começou a se perder na própria versatilidade. Ghost Opera (2007) ainda merecia aplausos, mas o disco seguinte, Poetry For The Poisoned (2010), errou a mão nas múltiplas referências musicais, além de ter exagerado na aura depressiva na opinião de muitos. Mas a banda continuava crescendo em termos de visibilidade. E por isso mesmo foi um choque para a cena quando foi divulgada a saída de Roy Khan, envolta em uma cortina de mistério e desinformação. A princípio estaria relacionada a problemas de saúde por parte do vocalista, mas depois foi ventilada a hipótese de que o norueguês teria virado fanático religioso e virado as costas para seu passado no profano Heavy Metal.


A banda ainda seguiu em frente com a turnê, apelando para alguns vocalistas convidados. O de maior destaque, Fabio Lione, atualmente no Angra. Mas em alguns shows o vocalista que assumiu o posto foi um relativo desconhecido, o sueco Tommy Kaverik, do Seventh Wonder. Vocalista prodigioso e versátil, Tommy ainda possui um timbre assombrosamente semelhante ao de Roy Khan, e talvez por isso mesmo terminou assumindo o posto vago em definitivo.

Kaverik, um emulador top de linha do Khan
O primeiro disco com Tommy nos vocais, Silverthorn, dividiu opiniões. Uma clara tentativa de retorno à sonoridade de Black Halo, agradou a muitos justamente por emular as fórmulas já testadas. Outros tantos ficaram decepcionados exatamente por conta do Cd soar como mais do mesmo, fato amplificado pelo que parecia ser um exaustivo esforço por parte do novo vocalista em emular todos os trejeitos de Roy Khan. Confesso que sou um dos que ficaram nessa segunda categoria e quando foi anunciado o novo disco, Haven, nem dei muita bola.  Mas será que eu estava certo em desdenhar do novo Kamelot?

Entre Dois Mundos

Fallen Star é a faixa de abertura dos sonhos para os fãs do Kamelot. Com ótimas melodias, atmosfera de trilha sonora, produção perfeita e peso sob medida, nasceu para frequentar os repertórios futuros. A pesadona Insomnia (ver vídeo) não fica nem um pouco atrás, e serve para notar o quanto as composições da banda são calcadas mais nos arranjos sinfônicos do que nos riffs de guitarra puramente. Aliás, tudo nessa banda é extremamente funcional, cada instrumento aparecendo apenas o suficiente para engrandecer a música.


A exceção é claro, se faz na performance de Kaverik. O cara rouba a cena em cada melodia e refrão, com uma capacidade de interpretação que só rivaliza com sua versatilidade. Sim, continua uma xerox do Roy Khan, mas é uma cópia tão bem feita que engana qualquer desavisado. Citizen Zero é outra faixa pesada e sombria, dessa vez com as guitarras de Thomas Youngblood um bocado mais à frente. A primeira música de trabalho, Veil Of Elysium poderia soar mundana na mão de outras bandas melódicas, mas com uma qualidade cinemática que dá o tom de quase todo o material aqui presente somada a mão pesada do rolo compressor Casey Grillo acaba por se tornar mais um destaque. Tematicamente, Thomas Yougblood diz ter tentado com Haven balançar entre dois mundos, o da fantasia (típico do estilo) e o da realidade nua e crua. E em termos musicais, o balanço ficaria entre os arranjos modernos e a base de melodias clássicas do Metal Melódico. 


Esse balanço infelizmente nem sempre se faz bem sucedido, como demonstra a fraca Under Grey Skyes, na qual Charlotte Wessels (Delain) participa. A tentativa de emular The Haunting ou Abandoned termina numa balada açucarada e sem graça (que ainda tem Troy Donockley do Nightwish, em vão). O peso com fortes toques góticos retorna triunfante com My Therapy.

Kamelot 2015 - o cabelinho do Grillo deixou Beiçola com inveja.
Depois de um curto interlúdio instrumental (Ecclesia), End Of Innocence faz o movimento pendular em direção ao lado mais melódico, mas ainda se mostra interessante. Perde de goleada para a dupla seguinte: Beautiful Apocalypse (com ar industrial e vocais femininos não creditados) e a pedrada Liar Liar, com ótima performance de Alissa White-Gluz tanto nos guturais quanto na voz limpa, mostrando que se o Arch Enemy não tiver muito medo dos velhos fãs, tem muito a explorar da bela canadense.

Alissa dando uma bela mãozinha aos colegas do Kamelot
Here’s To the Fall é a segunda balada do disco, e embora se saia melhor que Under Grey Skyes, fica bem aquém da capacidade da banda nesse quesito. A pedrada volta com Revolution, bem industrial e com outro show de Alissa. Uma pena que o final venha sob a forma da desnecessária faixa título, uma instrumental pouco inspirada.

Saldo Final

Após um período bagunçado que se refletiu em discos igualmente confusos e pouco inspirados, os estadunidenses lançam um de seus melhores e mais equilibrados trabalhos. Um deleite para aqueles que curtem discos pesados, mas muito bem pensados em termos de arranjos e produção. Frequentará facilmente as listas de melhores do ano por aí.

NOTA: 8,5

Disco Bônus da Edição Limitada:

O segundo disco traz 15 faixas, nenhuma representando material inédito, variando entre versões acústicas (Veil Of Elysium), piano e voz (End Of Innocence), orquestradas (Fallen Star, Here’s to the Fall e My Therapy) e instrumentais (9 versões). Um material bem feito e agradável, mas que está longe de poder ser considerado obrigatório.

O belo design da edição limitada
Indicado para:
Quem gosta do metal mais moderno, mas em abrir mão da melodia
Fuja se:
Tiver alergia a superproduções

Classifique como: Metal Melódico, Power Metal, Heavy metal, Symphonic Metal

Para Fãs de: Queensryche, Conception, Delain.
Ficha Técnica
Banda: Kamelot
Origem: EUA
Disco (ano): Haven – Limited Edition (2015)
Mídia: 2CDs
Lançamento: Napalm Records

Faixas (duração): CD  - 13 (54’). CD 2: 15 (67’)

Produção: Sascha Paeth + Kamelot
Arte de Capa: Stefan Heilemann + Gustavo Sazes

Formação:
Tommy Kaverick – vocals;
Sean Tibbetts – baixo;
Tommy Youngblood – guitarra;
Oliver Palotai – teclados;
Casey Grillo – bateria.

2 comentários:

  1. Muito boa sua matéria! Me inteirou sobre uns detalhes os quais eu somente supunha ou sequer imaginava.
    Conheci o Kamelot através da internet, junto com trocentas bandas do mesmo malfadado estilo e, assim como fiz com qse q a totalidade das bandas, torci meu grande nariz e não quis saber.
    Por conta de uma amiga q adora a banda, acabei sendo "exposto" a algumas de suas músicas; gostei de algumas, mas continuei detestando a grande maioria. Acho tudo dessa época meio interligado, formando uma grande massaroca ultra genérica, mas uma coisa uns 90% dessas bandas têm em comum: os músicos são excelentes tecnicamente - podem não ter carisma, identidade e mais uma porrada de predicados, mas não podem ser chamados de músicos ruins jamais!
    Sendo assim, então, tão bons músicos, é claro q em algumas vezes eles têm q acertar a mão; das poucas bandas q tive paciência pra escutar mais q algumas músicas, uma delas foi justamente o Kamelot, q, sei lá bem o pq, me agradou mais q muitas outras, talvez por conta das composições e performances individuais, sei lá... Outras bandas q eu colocaria ao lado dessa seriam o Therion e Adagio, talvez mais uma ou outra q j´[a não lembro o nome. Porém, as mais detestadas são mais fáceis de nomear Sonatta Arctica, Nightwish, Xandria, Stratovarios, Edenbridge e as cerejas estragadas do sundae de sorvete vencido: Rhapsody e Avantasia.
    De qqr forma, atualmente tem surgido tantas bandas se dedicando ao heavy metal mais tradicional q são tão boas q, Odin e Zeus nos ajudem, espero q toda essa porcariada genérica volte para o lugar de onde jamais deveriam ter saído, ou q escoem pela privadas e ralos q eventualmente tenham sujado...
    Marcello Lacerda

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    1. Fala, Marcello!
      Fico feliz em ter trazido boas informações (ainda que inúteis hehehehe).
      O Kamelot definitivamente não é o tipo de banda que normalmente eu escutaria, mas por algum motivo me conquistou. Sobre as bandas que você citou, concordo com a maioria das detestáveis, as incluiria o Therion nesse rol, acho um colhão de bode esse lance de ópera com metal, over demais hehehehhe
      Abração
      T

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