Capa da Edição Deluxe |
Avassalador
Por
Trevas
Prólogo: Uma Viagem ao
Inferno
Vinte anos se
passaram desde que o Machine Head
marcou seu nome na história do heavy metal com o lançamento do matador Burn My Eyes. Quem vê a banda
estampando as capas dos meios de imprensa especializados ao redor do globo pode
ter a impressão de que os californianos tiveram uma carreira repleta de
glórias. Ledo engano, Robb Flynn e
sua trupe trilharam uma estrada para lá de tortuosa.
O clássico Burn My Eyes |
A banda nasceu da ruptura de Robb
Flynn com a Vio-lence, em 1991.
Robb rapidamente se uniu ao amigo Adam
Duce, um adolescente problemático que havia recentemente pego gosto pelo baixo.
Duce indicou seu amigo de infância Logan Mader para a guitarra e o
baterista Tony Constanza assumiu as
baquetas. Os quatro gravaram uma demo sem muita expectativa, demo esta que
parou nas mãos de um executivo da Roadrunner.
Um contrato foi oferecido, Chris Kontos
assumiu a bateria e Burn My Eyes foi
gravado, se tornando o disco de estreia mais vendido da história da Roadrunner, 400.000 cópias justamente
em um período onde o Grunge havia praticamente sepultado a cena metálica.
Burn My Eyes revitalizara o
Thrash Metal, mas a partir daí a banda envolveu-se em escolhas para lá de
polêmicas. Não dá para dizer que o segundo disco, The More Things Change (já com Dave
McClain na bateria) seja ruim, mas sua abordagem com muito mais groove
falhou em impressionar os fãs mais xiitas, a despeito de possuir faixas como Ten Ton Hammer.
The Burning Red adicionou ao som do Machine Head elementos do então imberbe
(e infame) Nu Metal. Para deleite da Roadrunner,
e desespero dos puristas, o disco vendeu horrores (em muito puxado pelo sucesso
de The Blood, The Sweat, The Tears).
A mudança também se fez notar nas atitudes e no visual da banda, cada vez mais
próximas da estética Adidas comum à época. Internamente, as coisas desmoronavam
rapidamente. Robb, Duce e Mader chafurdavam cada vez mais em metanfetamina, com esse último
perdendo o posto após inúmeras brigas e ausências a ensaios e até mesmo shows. Mas
foi uma infeliz coincidência que quase pôs um ponto final na outrora promissora
carreira dos californianos.
Machine Head em sua controversa fase Pula-pula |
Apostando novamente no som do momento, o Machine Head gravou o fraco Supercharger.
A aposta da Roadrunner e da banda
era que o disco seria um sucesso entre os novos headbangers. E possivelmente
repetiria ou suplantaria a vendagem do lançamento anterior, não fosse a
coincidência citada anteriormente: o videoclipe para o primeiro single, Crashing Around You, trazia cenas de
vários edifícios desmoronando. Lançados poucos dias após o atentado de 11 se
setembro, o clipe e single foram banidos. A Roadrunner, que investira pesado na banda, resolveu rescindir o
contrato (lançando ainda o ao vivo Hellalive
para cumprir tabela). De postulantes a novos deuses do metal, os rapazes do Machine Head foram abandonados à
própria sorte. O vício em drogas e crescente conflito interno em nada ajudaram.
A história parecia chegar ao fim.
Ressurgimento das
Cinzas
Robb Flynn encontrou em sua esposa e filhos a força para
vencer o vício e em um misto de desespero e obstinação, resolveu tentar um recomeço.
Com o escudeiro Adam Duce e Dave McClain ao seu lado, escolheu Phil Demmel para o posto de guitarrista
e produziu sozinho o novo disco. Após dezenas de negativas em território
americano, Through The Ashes Of Empires
foi lançado na Europa. Os primeiros instantes da faixa de abertura, Imperium, já deixavam claro que o Machine Head havia voltado com sangue
nos olhos, abandonando para trás o modismo e os experimentos. A receptividade pela
mídia europeia fez com que a Roadrunner
USA resolvesse oferecer um novo contrato à banda em sua terra natal. A
presença no top 200 da Billboard marcaria o triunfo de Robb e o renascimento do Machine
Head.
Mas os californianos queriam mais. Após longa turnê e buscando inspiração
no Rush (em especial A Farewell To Kings), o Machine Head entra em estúdio para
gravar o ambicioso The Blackening.
Lançado em 2007, o disco conquistou a imprensa especializada e os
fãs europeus, com o mesmo alcançando o top 20 em vários países daquele
continente. Sua força residiu no casamento entre ferocidade e técnica, com
quase todas as músicas atingindo mais de 7 minutos de duração. Trilhando a
linha tênue entre a pretensão e a genialidade, o disco conquistou muitos novos
fãs para a banda.
Após uma turnê ainda mais longa que a anterior, é lançado Unto the Locust, em 2011. O disco
beirava a perfeição, com os eventuais exageros estilísticos de The Blackening dando lugar a temas
muito bem estruturados e de uma maturidade incomum, sem perder o peso
avassalador. Pela primeira vez o Machine
Head adentrou o top 25 da Billboard e em vários países da Europa a banda
chegara ao Top 5. Unto The Locust
não só manteve a boa fase, representou uma palpável evolução. Passada mais uma
turnê de sucesso, as relações internas se deterioram ao ponto da expulsão do
outrora fiel escudeiro Adam Duce. Em
meio ao turbilhão, Robb finalmente
anuncia seu novo rebento. Sinceramente, me peguei pensando: como seguir uma
sequência de discos tão fortes? Teria a boa fase chegado ao fim? Estava
preparado para a decepção, mesmo que de leve.
O Disco
Tal como I Am Hell no disco anterior, Now We Die inicia com arranjos
floreados. Dessa vez ao invés de um coral temos um quarteto de cordas que a
princípio soa estranho, mas acaba por dar um charme à música. Utilizada como primeiro
single, Now We Die segue o mesmo
padrão do material de Unto The Locust,
com estrutura épica, pesada sem abrir mão de um refrão memorável.
A primeira impressão, de continuidade na estética musical do disco
anterior, cai por terra já com Killers
& Kings, uma faixa direta que traz em seu refrão óbvia referência ao
Thrash oitentista, com gang vocals e tudo. Excelente e que deve ter presença garantida
nos shows dessa turnê. Ghost Will Haunt
My Bones ressuscita o Machine Head
de Through The Ashes Of Empires com
seu grande senso melódico aliado a muito peso.
Night Of The Long
Knives,
apresentada como segunda música de trabalho do disco, transmuta em violência
sonora os sangrentos assassinatos cometidos pelos seguidores do imbecil Charles Manson. A “Família Manson”, em
agosto de 1969, ao matar a atriz Sharon
Tate, quatro de seus amigos e o casal LaBianca,
sepultou também a utopia da geração do Verão do Amor e com ela toda a cultura
Hippie. Obviamente o ponto de vista de Robb
é ácido e esmiúça a patética capacidade humana de seguir cegamente a cultura do
ódio. Confesso que quando o Lyric Video fora lançado, Night Of the Long Knives não mexeu comigo. Mas após umas três
audições logo se tornou uma de minhas favoritas.
Sail Into The Black começa atmosférica,
com um fantasmagórico canto gregoriano adornado por um igualmente sombrio piano
coroando a maturidade de Robb Flynn
como compositor e arranjador. A segunda
metade de seus oito minutos de duração traz um riff monolítico, de um peso
absurdo. Mais uma grande faixa para a coleção do Machine Head.
Machine Head 2014 |
Eyes Of The Dead é mais visceral,
ainda que curiosamente intrincada, e é quase impossível não cantarolar Murder, Murder junto a seu refrão. Os duelos de solos entre Demmel e Flynn, destaque recorrente desde o ressurgimento da banda, ficam
cada vez mais impressionantes, remetendo aos tempos áureos do metal oitentista,
quando se dava uma grande importância a esses detalhes. Robb mostra nessa faixa que está cada vez melhorando mais como
vocalista, soando em alguns momentos mais brutal que nunca, e em outros com um
refinamento melódico só adquirido recentemente.
Robb após uma temporada na casa de Zakk Wylde |
Sim,
a versatilidade do novo disco já impressiona até aqui, mas Beneath The Silt ressalta ainda mais esse diferencial. A mesma parece
saída do bestiário musical do Down (inclusive
com Robb encarnando sua
personificação de Phil Anselmo em
alguns momentos) o que definitivamente não é ruim. In Comes The Flood, com sua letra atacando fortemente o “sonho
americano”, reitera a constatação de que Demmel
e Flynn andam com inspiração em alta
na criação de riffs. Novamente parece haver algum novo tempero na música, algo difícil de explicar: ainda soa como Machine Head,
mas de uma maneira diferente, reflexo de uma banda em seu novo auge.
Damage Inside funciona como um etéreo interlúdio para a
agressividade inclemente de Game Over,
uma cusparada venenosa em direção ao agora desafeto Adam Duce. O novato MacEachern
que no restante do disco luta bravamente para se fazer ouvir em meio à
performance sempre demolidora do excelente Dave
McClain (um dos bateristas mais subestimados da cena), aqui ganha seu merecido
destaque. Ainda que extremamente pesada, Game
Over tem um refrão tão contagioso que poderia figurar em algum hit de uma rádio
rock fictícia.
Capa da edição em formato tradicional |
Imaginal Cells, um interlúdio que mistura trechos de
falas com um tema instrumental que parece saído de algum trabalho do Megadeth, prepara o terreno para o
encerramento com Take Me Through the
Fire, a música mais mundana do repertório do novo disco. Não me entenda
mal, Take Me está longe de ser ruim,
apenas empalidece quando comparada a excelência do material que a antecedeu.
Saldo Final
Bloodstone & Diamonds é a prova cabal de que a torrente de
criatividade do renascido Machine Head
não tem limites. A qualidade do material aqui presente se faz ainda mais impressionante
se levarmos em conta que a banda não se rendeu à fórmula estética que garantiu
o sucesso dos discos anteriores. A temida estagnação criativa definitivamente
parece estar a uma galáxia de distância, mas dessa vez ao invés de me preocupar
com o que o futuro reserva para uma de minhas bandas favoritas, curtirei o seu
presente. Um presente brilhante, diga-se.
NOTA: 9,5
P.s.: A edição
Deluxe aqui analisada não apresenta nenhum material extra, mas vem encartada em
um belo Digibook cujo interior emula um livro de ocultismo. Apenas para os mais
aficionados.
Prós:
Grande músicas,
ótima execução e produção caprichada.
Contras:
Um pouco longo,
pode cansar os ouvintes com déficit de atenção.
Classifique
como: Modern Heavy Metal, Groove Metal, Thrash Metal
Para Fãs de: Fãs
de Thrash e de um Heavy mais moderno
Ficha Técnica
Banda: Machine
Head
Origem: EUA
Site Oficial: http://www.machinehead1.com/
Disco (ano): Bloodstone
& Diamonds – Deluxe Edition (2014)
Mídia: CD
Lançamento:
Nuclear Blast (Importado, versão nacional anunciada)
Faixas
(duração): CD - 12 (71’).
Produção: Robb
Flynn e Juan Urteaga
Mixagem: Colin
Richardson
Arte de Capa: Marcelo
Vasco e Rafal Wechterowicz
Formação:
Robb Flynn – Guitarra
e voz;
Phil Demmel –
Guitarra;
Jared
MacEachern – baixo;
Dave McClain –
bateria.
Tinha perdido o respeito por eles, se venderam, viraram música de moleque boiola, mas escutei um pouco desse disco aí e tá da hora. Acho que vou até tirar a poeira do Burn My Eies.
ResponderExcluirvaleu
Danilo
Fala, Danilo
ExcluirPois é, os caras realmente pisaram um pouco na bola. Mas pode ter certeza, do Through The Ashes em diante, é só disco foda!
Abraço
T