quinta-feira, 17 de abril de 2014

This Is Your Life – Ronnie James Dio (Cd – 2014)

This Is Your Life
Vida Longa Ao Rei!
Por Trevas

Do Fim ao Início

Maio de 2010, recebo a ligação de um amigo e companheiro de banda. A voz do outro lado da linha trazia com ela todas as sombras de Mordor reunidas. Prendo minha respiração, enquanto a voz titubeante faz rodeios e não chega à evidentemente macambúzia noticia, e espero pelo pior. Finalmente a mensagem é passada “cara, o Dio morreu”. Fiquei surpreso e tive vontade de rir, dentre todos os cenários macabros que meu cérebro conseguira produzir desde que atendi o telefonema, esperava a fatalidade dentro do meu círculo social, e de certa forma fui tomado de imenso alívio. Brinquei um pouco com a situação e desliguei o telefone. Demorou cerca de cinco minutos até que me sentisse como se realmente a fatalidade tivesse se abatido sobre algum amigo próximo. Ronnie James Dio nunca soube de minha existência, mas sua voz falava comigo desde meus 16 anos de idade. Lembro-me como se fosse hoje: estava em São Paulo, entro no carro de um de meus tios, ia com ele até a galeria do rock, com dinheiro separado para comprar os discos faltantes a minha coleção do Iron Maiden.  A fita começa a rodar uma introdução que trazia uma fala de O Mágico de Oz, seguida de um rebuliço instrumental, e então um riff matador. Eu era fanático por Purple e em especial Ricthie Blackmore e reconheci o estilo do guitarrista de imediato. Quando achei que já era a melhor coisa que eu escutara até então, entra uma voz arrebatadora que me fez esquecer Ricthie Blackmore. A música era Kill the King, naquela versão do ao vivo On Stage. A voz, Ronnie James Dio. E repentinamente Bruce Dickinson já não me parecia mais o cara. E então eu soube que eu precisava escutar tudo o que aquele enigmático e gnomesco vocalista havia gravado. Meu dinheiro saiu do colo do insepulcro Eddie para a aquisição dos três discos de estúdio do Rainbow.

O grande amigo que nunca conheci
Stand Up And Shout

Wendy Dio fora casada com Ronnie James Dio por quase três décadas. Embora já separados quando Ronnie adoeceu, foi ela quem ficou ao lado do vocalista até os últimos instantes. Única empresária que Dio teve em sua carreira, Wendy criou em conjunto com o já enfermo músico o Stand Up And Shout Cancer Fund, instituição filantrópica que tem como alvo angariar recursos para investir em pesquisas relacionadas à cura e tratamento do câncer. Em seu leito de morte, Ronnie deixou uma missão nas mãos de sua companheira, todos os lançamentos póstumos que levassem sua marca deveriam deixar 100% da arrecadação atrelada ao fundo. Um ato que demonstrou que Dio manteve sua famosa nobreza até o último suspiro. Um verdadeiro legado de um pequeno grande homem.

Wendy e Ronnie - eternos amigos
Desde então alguns títulos já foram lançados com essa finalidade, em sua maioria explorando o vasto arquivo de gravações ao vivo nunca lançadas pelo vocalista. Em 2012, Wendy começou a trabalhar na ideia de um disco tributo, trazendo artistas famosos, cujo nome trouxesse um peso à causa que ela abraçou. Discos tributo ao Dio não são exatamente uma novidade, e em 1999 já havia sido lançado o ótimo Holy Dio, trazendo a nata do segundo escalão metálico em versões em sua maioria muito boas para os clássicos da carreira do anão (e.g.: Blind Guardian; Grave Digger, Doro, Fates Warning...). Mas quando foi anunciado que o tributo atual trazia gente como Motörhead, Scorpions, Anthrax e em especial Metallica, entendi o quão alto Wendy havia mirado. Contando com a excelente arte de capa de Marc Sasso, This Is Your Life foi lançado com grande expectativa. O legal é que o disco foi alçado diretamente à 25ª posição na parada da Bilboard, feito assombroso em se tratando de material relativo a um artista já falecido e que desde a longínqua década de 1980 não fazia parte do mainstream. Sinal de que a boa música nunca morre.

A excelente arte de Marc Sasso para o disco
This Is Your Life - Faixa a faixa:

Anthrax - Neon Knights
Os nova-iorquinos já haviam homenageado Dio em 2011, incluindo uma versão de Heaven And Hell em seu set na turnê do Big 4. Mas essa rendição de Neon Knights ficou bem mais bacana. Baseada em parte na original de estúdio, em parte na versão estendida costumeiramente apresentada pelo Black Sabbath ao vivo, cabe aqui destacar a voz de Belladonna, que ao menos em estúdio vem soando melhor que em seus tempos de sucesso com a banda. Ah, curiosamente, o guitarrista solo nessa faixa ainda é Rob Caggiano, que pouco depois disso abandonaria o posto para assumir as cordas no Volbeat. Um ótimo início.


Tenacious D – The Last In Line
A banda piada liderada pelos comediantes Jack Black e Kyle Gass sempre teve ligação estreita com Ronnie. Jack era amigo pessoal do gnomo e o D já havia homenageado o vocalista em seu primeiro disco, com uma música intitulada...Dio! Ah, e os artistas trocaram favores algumas vezes, com os comediantes participando do clipe de Push (de Killing the Dragon) e Ronnie aparecendo no filme da dupla, The Pick Of Destiny. A versão para Last In Line é bem legal, mais curta que a original,com a voz peculiar de Black guiando a canção com maestria. O solo de flauta substituindo o icônico original de guitarra foi um toque bem bolado.

Black, Gass e Dio: Tenacious Dio?
Adrenaline Mob – The Mob Rules
Existem dois vocalistas da atualidade que fazem justiça ao trono deixado vago por Ronnie. Um é o norueguês Jorn Lande e o outro é o estadunidense Russel Allen, que capitaneia o Adrenaline Mob. The Mob Rules foi gravada para o EP Covertà, quando Mike Portnoy ainda fazia parte da banda, e é tão fiel à original quanto avassaladora. Um dos destaques do disco.


Corey Taylor, Christian Martucci, Russ Parrish, Roy Mayorga – Rainbow In The Dark
Corey Taylor, o espoleta que lidera o Stone Sour e o Slipknot fez questão de participar do tributo. Fã confesso de Dio, juntou seus colegas de Stone Sour a Russ Parrish (ex- Fight) e gravou a toque de caixa essa surpreendentemente boa versão para a música mais famosa da carreira solo de Ronnie. Com boa performance vocal por parte de Corey e uma linha de guitarra substituindo o teclado original com maestria, Rainbow In The Dark pode ser uma porta de entrada para a molecada se interessar pelo catálogo do Dio. (Nota do Trevas: li em alguns lugares que Satchel, dos gaiatos do Steel Panther participa dessa faixa. No encarte ele não vem listado, qual foi então minha surpresa ao descobrir que Satchel e o sumido Russ Parrish são a mesma pessoa!!!!)


Halestorm – Straight Through The Heart
Uma das promessas do Hard/Heavy da atualidade, o Halestorm optou por fazer uma versão crua, sem a refinada produção que guiou seu último disco. Uma escolha acertada, a música ganhou uma cara nova, em parte pela pegada atual em outra pela excelente e poderosa voz de Lzzy Hale. Outra pedrada certeira.

Lzzy trazendo um toque feminino ao tributo

Motörhead & Biff Byford – Starstruck
Amigo pessoal de Ronnie desde os anos 1970, Lemmy não podia ficar de fora dessa festa. E não podia ser outra a escolha, Strastruck fala sobre um tema tipicamente Motörhead – a história de uma insaciável groupie. A participação do monocelha Biff Byford (do Saxon), cuja voz parece não envelhecer nunca, dividindo os microfones com Lemmy deixou essa versão com uma aura toda especial.


Scorpions – The Temple Of The King
A rendição dos alemães para a bela balada The Temple Of The King é um daqueles casos nos quais temos a impressão de que a música poderia muito bem ter sido escrita por eles, tamanha a identificação. Outro grupo que tinha uma boa relação de amizade com Dio, os Scorpions tomam para eles uma das músicas mais inspiradas do Rainbow. É de arrepiar.

Gnomos gêmeos? Dio e Klaus

Doro - Egypt (The Chains Are On)
Outro caso no qual a música se encaixa perfeitamente com o estilo do artista que a coveriza, Egypt já havia aparecido no excelente tributo Holy Dio. Doro, outra amiga de longa data do baixinho, dá uma vida toda nova à faixa com seu vocal rouco e algo sexy. Volta e meia a alemã adiciona essa mística canção em seus set lists.

Doro e Dio - a realeza do metal

Killswitch Engage – Holy Diver
Gravada em 2007, especialmente para uma edição da Kerrang!, essa versão para a música título do primeiro disco solo do Dio ganhou notoriedade na época, em especial pelo seu hilário clipe, que fazia troça com o tosco e icônico original. Ainda trazendo o excelente vocalista Howard Jones em sua line up, o KSE foi responsável por apresentar Ronnie Dio e sua música para a garotada fã da NWOAHM. Talvez a versão soe estranha aos ouvidos mais puristas. Particularmente, acho excelente.


Glenn Hughes, Craig Goldy, Rudy Sarzo, Scott Warren & Simon Wright – Catch The Rainbow
Bem, Hughes foi um dos melhores amigos de Ronnie, tendo até mesmo dividido um apartamento com o gnomo nas épocas de vacas magras. Foi ele o escolhido por Wendy para o concerto do Heaven And Hell que homenageou seu marido (em conjunto com Jorn lande, que acabou por se desentender com ela). Escoltado por ex-colegas de banda de Dio, Hughes acaba exagerando demais no tempero soul de sua interpretação, deixando a bela música um pouco estranha. Não ficou exatamente ruim, em absoluto, mas confesso que demorei algumas audições até me acostumar.


Oni Logan, Jimmy Bain, Rowan Robertson & Brian Tichy - I
O bom vocalista Oni Logan, famoso por ter feito parte do Lynch Mob, faz um trabalho bacana nessa excelente faixa do subestimado Dehumanizer. Um pouquinho respeitosa demais à original, a faixa acaba chamando mais a atenção por trazer de volta aos holofotes Rowan Robertson, que aos 19 anos apareceu ao mundo como o guitarrista prodígio que gravou o mediano Lock Up The Wolves do Dio.


Rob Halford, Doug Aldrich, Jeff Pilson, Vinny Appice, Scott Warren – Man On The Silver Mountain
Outra faixa a trazer um vocalista lendário escoltado por ex-colegas de Ronnie, Man On The Silver Mountain causa estranhamento a princípio. O metal god, a exemplo de quando capitaneou improvisadamente o Black Sabbath por dois shows, dá um pouco a impressão de que não está muito à vontade, mas na volta do solo ele acaba por se soltar mais e tudo se encaixa. De qualquer forma, a pegada da música ficou bem legal, com Aldrich brincando com o riff original no início da música, e após algumas audições acabei me acostumando e achando ótimo o cover.


Rob e Dio gravando Stars
Metallica – Ronnie Rising Medley
Quem me conhece sabe que não tenho nenhum apreço pela banda comercialmente mais bem sucedida da história do metal. Para variar, os ególatras condicionaram sua participação no tributo a não ficarem restritos a uma única música. Torci o nariz. Quando me disseram que o medley, que inclui trechos de Light In The Black, Tarot Woman, Stargazer e Kill The King (todas do Rainbow), estava matador, fui escutar cheio de preconceito. Quebrei retumbantemente minha fuça implicante. Alucinante desde a introdução, o medley traz o Metallica com uma fúria e perícia que não são vistos nos caras desde sei lá quando. E Hetfield conseguiu driblar de maneira brilhante suas limitações vocais, trazendo soberbamente músicas bastante complicadas de cantar ao seu característico estilo. Até mesmo a escolha da manjada Kill The King (que 789 bandas já coverizaram) tem que ser perdoada, é a melhor rendição para essa música que ouvi afora a original. Só para não dizer que perdi o sangue nos olhos e o veneno na língua, a passagem de Tarot Woman para Stargazer podia ter sido melhor elaborada, mas pedir que Lars replicasse a mítica introdução criada por Cozy Powell com alguma decência é um pouco demais, não? De qualquer maneira, num disco com nível bastante elevado, o Metallica conseguiu sobressair, tenho que dolorosamente admitir.


Dio – This Is Your Life
Talvez a única coisa que preste em Angry Machines, de longe o pior disco solo de Dio, this Is Your Life é uma balada belíssima. Com sua letra ganhando um significado tocante perante a morte de nosso ídolo, chega a dar arrepios ouvir a majestosa voz de Ronnie versar sobre a efemeridade de nossa existência. E sua performance nessa faixa serve para nos lembrar do imensurável talento que perdemos.

Saldo Final
Um excelente disco, repleto de talento e coração, feito para uma causa nobre e homenageando o maior vocalista que o heavy metal já ouviu. Preciso dizer mais?
O pequeno grande rei viverá para sempre através da atemporalidade de sua música.
E nós mortais temos que celebrar seus feitos, hoje e sempre. Agora me dá licença que vou escutar o disco de novo!

NOTA: 9,5


Prós:
Repleto de artistas consagrados, do passado e da atualidade. Todas as versões transpiram respeito e prazer em fazer parte da homenagem.

Contras:
Podia bem ser triplo...

domingo, 6 de abril de 2014

Behemoth – The Satanist (CD+DVD – 2014)

Behemoth - The Satanist (2014)
Renascido Nas Trevas
Por Trevas

Prólogo – Vencendo A Morte

Na ativa desde 1993, o Behemoth galgou terreno para fora de sua Polônia natal e se tornou um dos expoentes máximos da cena extrema mundial ao gradativamente mesclar seu Black Metal claramente influenciado pelas bandas Norueguesas com elementos de Death Metal, criando obras clássicas como Demigod e Apostasy. Utilizando temáticas pagãs, episódios bíblicos e vertentes da filosofia satanista como alegoria para explorar sentimentos obscuros e provocar reflexões profundas sobre a fé, vida e morte, o refinamento artístico da banda parecia ter atingido seu ápice com Evangellion, o ótimo disco de 2009 (ver clipe para Ov Fire And The Void). Esse disco atingiu o primeiro lugar nas paradas Polonesas e fez com que o Behemoth, sem fazer grandes concessões estilísticas, obtivesse grande sucesso comercial fora do nicho extremo.

Behemoth é só simpatia!
A alta de popularidade veio em conjunto com uma notícia inicialmente devastadora: no princípio de 2010, o vocalista, guitarrista e principal compositor Adam Darski (aka Nergal) foi diagnosticado com um tipo agressivo de leucemia. A doença não estava em estágio inicial e os prognósticos eram desanimadores. O Behemoth entra em recesso, mais que uma carreira, havia uma vida em jogo.




Submetido a um transplante de medula e a agressivas sessões de terapia, e munido de grande força interior somada à confiança no trabalho dos médicos, Adam conquistou a improvável vitória em meados de 2013. Ainda fisicamente fragilizado, iniciou então as sessões de composição e gravação daquele que acreditava ser seu trabalho mais forte e pessoal, um testamento de sua obstinação, nova visão de mundo e seu amor à vida. Lançado em janeiro de 2014, envolto em muita curiosidade e dúvidas, The Satanist é o resultado final dessa imersão na alma de um homem que venceu a primeira grande batalha contra a morte.





Sim, Nergal sorri!
Conceito e Arte Gráfica

Católico por criação e agnóstico por opção, Nergal é um profundo conhecedor da bíblia e dos textos apócrifos, além de ávido leitor de obras sobre misticismo, religiões e mitologia em geral. Embora tenha dito nas entrevistas de promoção do novo álbum que não sente necessidade de explicar os significados por detrás do título e letras de The Satanist, Nergal sempre se identificou com a filosofia por detrás do satanismo e sua visão de Satã como uma figura que representa a crença no indivíduo e sua força interior em detrimento dos dogmas religiosos. Como já exposto em Evangellion, o satanismo, Cristão por definição, inspirou a figura do capiroto no velho Dionísio Grego (ou Baco, para os Romanos). A temática do novo disco é iconoclasta, um manifesto da sabedoria e libertação que advém da luta (e vitória) contra uma grande adversidade, no caso, a confrontação com a inevitável mortalidade – adiada, mas nunca negada. Como diz Nergal no documentário que acompanha a edição limitada: “é o homem se reinventando e questionando suas próprias fundações – a arte de se reconstruir sobre as cinzas de seu antigo mundo.”

Arte Alternativa feita para a versão em LP
A mistura da mitologia de Satã e Dionísio foi a inspiração do artista Russo Denis Forkas para a arte de capa e demais artes que acompanham o cuidadoso e belíssimo encarte. Como que para ratificar o teor pessoal de sua obra, Nergal cedeu seu sangue para ser misturado na paleta de cores utilizada por Forkas. A despeito disso representar simbolicamente algo realmente significativo para o vocalista, convenhamos, é uma bruta artimanha para ser utilizada em termos de marketing (a manjada estratégia já foi utilizada anteriormente por Kiss e Manowar, dentre outros). De toda a forma, o cuidado com a arte gráfica de The Satanist é das melhores que já vi. Soberba.

O Disco

Produzido pela própria banda e mixado por uma miríade de profissionais gabaritados (os caras conseguiram brigar com quase todos que se envolveram na feitura do disco, inclusive o renomado Matt Hyde), o disco abre com a estonteante Blow Your Trumpets Gabriel!, que ganhou um vídeo clipe tão belo quanto assombroso (ver abaixo).  Épica em intenção, não em duração, a faixa de abertura é um manifesto inconteste da maturidade atingida pelo Behemoth. Serve também como um bom cartão de visitas para o disco: o som é pesadíssimo, muito bem produzido, dinâmico, mas bastante cru em seu minimalismo. Nada soa gratuito, e mesmo os belos arranjos de sopro, pouco usuais dentro do estilo, soam urgentes e necessários.



Quem acreditava que a doença de Nergal amansaria o som da banda ficará com o queixo caído perante a violência abissal de Furor Divinus e da agonia sufocante de Messe Noire. Na sessão de gravação desta última, o baterista Inferno declarou a Nergal que podia sentir a leucemia nos riffs da música, como se o guitarrista houvesse conseguido metamorfosear a doença em som.

A banda e uma amiguinha em 2014
Ora Pro Nobis Lucifer (ver vídeo) cheira a clássico. Visceral e ao mesmo tempo estruturalmente mais acessível que a média das músicas da banda, provavelmente ganhará vaga cativa nos set lists dos shows daqui para frente. Amen assalta nossos ouvidos como uma tormenta, lembrando um pouco os momentos mais pesados do Vader atual. A faixa título é cadenciada e possui um arranjo algo progressivo e atmosférico, fazendo um contraste com a primeira metade do disco, criando uma dinâmica interessante. Curiosamente é nesse momento de relativa calmaria em que podemos perceber melhor a qualidade de execução de todos os instrumentos. Reconhecidamente uma banda técnica, nesse disco o Behemoth subjuga o ego de suas partes em prol do resultado final.


Ben Sahar tem uma aura épica e algo Doom beneficiada pelo cuidadoso arranjo. In the Absence Ov Light é a faixa mais pessoal do disco, trazendo uma parte falada em sua metade, na qual Nergal diz, em Polonês:
“Give me a human.
Let him be just like me, just like me…
Dull, unripe, unfinished, not dark, and not bright.
So that I may with him dance, play with him,
with him fight, in front of him pretend,
give him thanks, and him, rape...
fall in love with him, through him recreate myself,
grow through him, and sprouting this way,
wed myself, in the church ov man.”

Mas talvez o ápice do disco venha mesmo em seu encerramento, sob a forma da monstruosa O Satan O Father O Sun, que mescla o som extremo a um andamento que deve em muito a épicos como Stargazer (Rainbow) e Kashmir (Led Zeppelin).


Saldo Final

A audição de The Satanist se assemelha a passagem de uma tempestade de verão. Vemos o céu enegrecer, sentimos a angústia de estar no meio de uma força incontrolável, e quando parece que o mundo não sobreviverá à fúria dos céus, repentinamente a escuridão se esvai e, embora tenhamos os destroços e inundações para nos lembramos de que sua passagem foi real, o sentimento de ver novamente a claridade e seu conforto é que permanecem. Sim, um disco avassalador e sombrio, mas que ao mesmo tempo transparece alguma positividade ao seu final. Sentimentos antagônicos que só uma obra muito acima da média pode proporcionar. Um dos discos do ano, não tenho medo de afirmar, e olha que e não estamos nem na metade de 2014.  


NOTA: 9



DVD da Edição Limitada

A edição aqui analisada não possui faixas bônus de estúdio, mas sim um DVD com dois capítulos distintos: Live Barbarossa e The Satanist: Oblivion.
O primeiro capítulo contém uma apresentação de 70 minutos da banda na turnê Phoenix Rising, que marcou o retorno da banda aos palcos em 2013, após o longo hiato ocasionado pela doença de Nergal (ver vídeo). São treze faixas eximiamente bem executadas que exemplificam bem o já famigerado poderio da banda ao vivo. A qualidade de som é excelente, já a imagem e edição são apenas boas. Em determinado momento do show, um visivelmente energizado Nergal exclama para a ensandecida platéia Russa: “It Feels Good To Be Alive!!! Never Give UP!!!” – Um testemunho curioso e honesto que soaria menos deslocado saindo da boca de um artista purpurinado de alguma banda de Hard Rock festiva.





O segundo capítulo vem sob a forma de um documentário de 25 minutos versando sobre a concepção do novo disco. Magistralmente filmado, o documentário mistura uma série de imagens belíssimas em P&B, com narrativa bastante elucidativa por parte de Nergal e eventuais intervenções dos demais envolvidos na feitura da obra. Poético e sombrio, o documentário ajuda a fazer dessa edição limitada uma aquisição obrigatória àqueles que ainda gostam do formato em mídia física.

Setlist para Live Barbarossa: 1. Intro; 2. Ov Fire And The Void; 3. Demigod; 4. Moonspell Rites; 5. Conquer All; 6. Christians To the Lions; 7. The Seed Ov I; 8. Alas, Lord Is Upon Me; 9. Decade Ov Therion; 10. At The Left Hand Ov God; 11. Slaves Shall Serve; 12. Chant For Ezkaton 2000; 13. 23 Youth Manifesto; 14. Lucifer.


Foto da edição limitada (Cd + DVD)
Prós:
Pesado e sombrio, com ótimos arranjos e idéias, mas ainda assim acessível.

Contras:
As letras podem ser blasfemas demais aos headbangers cristãos. Pode te dar medinho de dormir sozinho.

Classifique como: Black Metal, Death Metal, Blackened Death metal

Para Fãs de: Vader, Dimmu Borgir, Emperor, Watain, Ihsahn.

Ficha Técnica
Banda: Behemoth
Origem: Polônia
Site Oficial: http://behemoth.pl/
Letras: http://www.darklyrics.com/lyrics/behemoth/thesatanist.html
Disco (ano): The Satanist (2014)
Mídia: CD (Cd+DVD na edição limitada)
Lançamento: Metal Blade (Importado)

Faixas (duração): 09 (43’).
1. Blow Your Trumpet Gabriel!; 2. Furor Divinus; 3. Messe Noire; 4. Ora Pro Nobis Lucifer; 5. Amen; 6. The Satanist; 7. Ben Sahar; 8. In the Absence ov Light; 9. O Father O Satan O Sun!

Produção: Behemoth
Arte de Capa: Denis Forkas

Formação:
Nergal – voz, guitarra;
Seth – Guitarra;
Orion  - baixo
Inferno – bateria.

terça-feira, 1 de abril de 2014

Adrenaline Mob – Men Of Honor (CD – 2014)

Adrenaline Mob - Men Of Honor (CD - 2014)
Adrenaline Mob – Men Of Honor (CD – 2014)

Finalmente Honrando a Famiglia!

Por Trevas

Um Disturbed Com esteróides?

Quando foi anunciado, em meados de 2011, o surgimento de um supergrupo de Heavy Metal reunindo o exímio Russell Allen (vocal, Symphony X), o subestimado guitarrista Rich Ward (do finado Stuck Mojo) e o polvo workaholic Mike Portnoy (então recém demissionário do Dream Theater), fiquei realmente curioso. Minha empolgação foi em bastante amplificada ao ler que esse supergrupo se afastaria o máximo possível do estilo que consagrara as bandas de origem de Russell e Portnoy, o por vezes asséptico Metal Progressivo. Completando o plantel, o virtuoso guitarrista Mike Orlando e o baixista Paul DiLeo (Fozzy). A banda lançou seu primeiro EP ainda em 2011, para reações um tanto quanto divididas: o approach moderno e direto causou algumas reclamações dos fãs de prog metal, enquanto outro grupo achou cedo demais para se tirar alguma conclusão.

The Mob - Primeira Turma
Em 2012 foi anunciada a saída de Rich e Paul, tendo sido o último substituído pelo baixista do Disturbed, John Moyer. Curiosamente, o disco de estréia da banda, Omertà, traz claras referências o som da banda de origem de Moyer. Sim, o primeiro tento do Mob soa exatamente como uma versão anabolizada do Disturbed. Nada contra, mas faltou o tino para músicas grudentas que fez do grupo de David Draiman um fenômeno de vendas nos Estados Unidos. Convenhamos, além de Undaunted (ver vídeo), muito pouco chama a atenção naquele disco. E quando sua melhor música é uma regravação metalizada para um hit do Duran Duran, é sinal de que há algo errado.


2013 viu a chegada do segundo EP do Mob, Covertà, um pacote de covers com resultados bastante desiguais (ver resenha da Cripta aqui). Logo após esse lançamento, Portnoy anuncia sua saída da banda, o que despertou o sentimento generalizado de que a história dos caras havia chegado a um fim, algo bastante corriqueiro no mundo do rock quando se trata de supergrupos. Muitos, como eu, foram pegos de surpresa quando foi anunciado não só que a banda já possuía um substituto para Mike, como também que um novo disco já estava no forno. O novo baterista é AJ Pero, o mão de marreta popularmente conhecido por envergar trajes de traveco e destruir peles e baquetas pelo lendário Twisted Sister. Convenhamos, um nome muito mais condizente com o estilo grosseirão do Adrenaline Mob. Como não havia me empolgado em nada com os lançamentos anteriores dos caras, ia deixar esse passar, até que um amigo me recomendou fortemente que desse uma chance a esse Men Of Honor. Então, lá fui eu escutar a bolachinha.

AJ pega dicas de maquiagem no Blog de minha esposa
Bem Vindo à Famiglia, AJ!


O começo é para lá de promissor, AJ descendo a lenha enquanto Mike Orlando faz um solo à lá Eruption (Van Halen), logo descambando para um Riff que podia muito bem estar no novo disco do Black Label Society. MIB (Mob Is Back, ver vídeo) soa exatamente como algo da banda de Zakk, com a vantagem de ter um dos melhores vocalistas do mundo no lugar do grunhido não mais que esforçado do nosso Viking ursão. A produção e mixagem ficou ao encargo do próprio Orlando que, além de debulhar nos solos de maneira impressionante, deixou a bolachinha com um som cristalino e repleto de punch.


Come On Get Up (ver vídeo) traz aquela veia moderna do disco de estréia, e apesar de possuir uma linha repetitiva nos versos (com participação vocal de Orlando), se salva devido ao refrão legal e por conta do bom solo.  Dearly Departed é a primeira faixa onde percebe-se um grande diferencial em relação ao lançamento anterior: Men Of Honor possui um bocado de infusões de um Heavy Metal mais clássico. Uma faixa bem legal, que exemplifica bem o estilo que a banda buscou no novo disco.


Behind These Eyes é a primeira balada do CD e seria forte candidata a povoar uma daquelas coletâneas tipo Lovy Metal, se elas ainda existissem. Uma faixa bonitinha que faria inveja ao Skid Row. Os riffs e vocais à lá Disturbed voltam em Let It Go, outra (boa) faixa com vocais divididos entre o abissal Russell e Orlando. Russell, aliás, canta um pouco mais solto nesse disco, não tentando soar malvadão o tempo todo, o que pode agradar um pouquinho mais os fãs de seus outros trabalhos fora do Mob.

Adrenaline Mob e o Visual Proxeneta Boladão
Em Feel The Adrenaline (ver vídeo) comecei a entender que a banda finalmente achou sua cara. Um misto entre o metal sujão e moderno com boas pitadas de tradicionalismo aqui e acolá. A banda definitivamente já não parece um primo mal humorado do Disturbed. John Moyer tem seu momento de destaque justamente nessa faixa, com um curto solo, e AJ Pero mostra mais uma vez que foi uma adição perfeita ao grupo. Apesar de Orlando e Russell serem os destaques absolutos do disco, a pegada pesadona do ex- traveco agregou bastante ao resultado final.


A faixa título (ver vídeo) faz o balanço perfeito entre moderno (versos) e tradicional (refrão), mostrando que a dobradinha vocal entre Russell e Mike veio para se tornar uma das marcas registradas dos caras. Crystal Clear começa como uma baladinha voz e violão meio chocha. E é isso mesmo que ela é, mas quando se tem um vocalista da grandeza de Sir Russell, até baladas chochas valem a pena. House of Lies quebra a tranqüilidade com um baita riff, letra escandalosamente idiota recheada de testosterona, berros do soberbo vocalista e um bom refrão. Um dos destaques, na certa. Judgement Day pode soar tão batida quanto o título indica, mas a energia compensa e é impossível não ter aquela vontade de banguear ao seu som. Falling To Pieces, a última do disco, tem a cara de metal feito para tocar no rádio. Mas é bem feita e cola na cabeça de imediato, encerrando Men Of Honor de maneira para lá de satisfatória.


Saldo Final

Justamente quando muita gente já não apostava mais no Adrenaline Mob é que os caras vieram com sangue nos olhos mostrar serviço. O grande mérito da banda no novo disco foi ter encontrado um meio termo entre a modernidade e o som mais tradicional, talhando assim uma cara própria e identificável, o que havia faltado em Omertà. Fico feliz por ter dado atenção à recomendação daquele meu amigo, Men Of Honor, a despeito das letras imbeciloides de machão boladão, é um disco de metal bastante divertido. Nada que vá mudar o mundo, mas quem se importa?


NOTA: 8


Prós:
A banda finalmente vai achando seu som. Músicas diretas e contagiantes. Grande trabalho de guitarra e voz. AJ Pero afunda crânios, para variar, só que dessa vez sem batom e rímel.

Contras:
Sonoridade bastante simples, letras idiotas. Ah, AJ Pero é ainda mais feio sem maquiagem!

Para Fãs de: Black Label Society, Disturbed, Dio.

Ficha Técnica
Banda: Adrenaline Mob
Origem: EUA
Disco (ano): Men Of Honor (2014)
Mídia: CD
Lançamento: Hellion Records (Nacional)

Faixas (duração): 12 (62’). 10 faixas na versão comum
1. Mob Is Back; 2. Come On Get Up; 3. Dearly Departed; 4. Behind These Eyes; 5.Let It Go; 6. Feel The Adrenaline; 7. Men Of Honor; 8. Crystal Clear; 9. House Of Lies; 10. Judgement Day; 11. Falling To Pieces.

Produção: Mike Orlando
Arte de Capa: Marc Sasso

Formação:
Russell Allen – voz;
Mike Orlando – Guitarras e voz;
John Moyer - baixo
AJ Pero– bateria.