E O Zeppelin Levantou Vôo de Novo
Lemmy Said
Certa vez li uma entrevista com Lemmy Kilmister onde o repórter,
maravilhado em descobrir que o velho tio Crocotó havia conhecido o falecido Randy Rhoads, perguntara sobre a
genialidade do lendário guitarrista que salvara Ozzy do ostracismo (e de si mesmo). Lemmy então disse que lembrava de Randy como um garoto comum, miúdo, quieto e que gostava de
videogames. O entrevistador insistiu sobre a qualidade técnica de Randy, e curiosamente Lemmy se sai com essa pérola (ou ao
menos, com algo parecido com o que transcrevo aqui): “Sabe, a morte nos torna
pessoas melhores do que éramos”.
E por mais estranha que possa ser a sabedoria
provinda de verrugas embebidas em Jack Daniels com Coca-cola, ela funciona
também para as bandas. Os Rolling Stones
nunca serão maiores que os Beatles,
pois os enrugados bad boys viveram o suficiente como banda para experimentar a
decadência, já os Beatles viverão
para sempre no imaginário popular em seu auge. Da mesma maneira o Led Zeppelin com o tempo se tornou a
maior marca dos anos 1970, porque simplesmente a trágica morte de John Bonham abreviou a carreira da
banda, que nunca passou por fases de vacas magras como seus “concorrentes” Deep Purple e Black Sabbath, por exemplo. E fiquem certos, a fase ruim estava a
espreita, vide a grosseira queda de qualidade dos lançamentos do Zeppelin posteriores a Physical Grafitty (1975), os
irregulares Presence (1976) e In Through The Out Door (1979).
Led Zeppelin em seu apogeu |
Em suma, o Led Zeppelin se tornou um mito cada vez maior, nutrido pelas memórias
embebidas em ácido daqueles que tinham visto a banda ao vivo em seu apogeu, e
no imaginário das novas gerações, que nunca teriam a chance de assistir a
banda, tendo como referência apenas os registros das memórias dos mais velhos.
Ahmet, o Necromante
E tal qual um rito de ocultismo daqueles que
supostamente atraiam a atenção de Jimmy
Page no passado, foi a morte de um ancião que trouxe a banda de volta à
vida: Ahmet Ertegun, fundador e
presidente da Atlantic records, casa
do Led Zeppelin, Bad Company dentre outros, falecera em
dezembro de 2006.
Um evento memorial em homenagem a um ano do falecimento do
empresário foi planejado para ocorrer em dezembro de 2007, contando com
diversos artistas que ao menos em um ponto de suas carreiras haviam tido a Atlantic como porto seguro. Foram confirmados
membros do Emerson lake And Palmer, Yes, Foreigner e Bad Company.
Mas a cereja do bolo, depois de meses de negociação seria a primeira aparição
em público do Led Zeppelin desde 1985.
Ahmet, o carequinha da foto |
Negociações da Pesada
Mas não foi fácil. As conversas,
ao contrário do que se imaginara a princípio, não foram endurecidas por um
magoado John Paul Jones, que fora
esquecido por Page e Plant em diversas ocasiões para
discutir assuntos relativos ao catálogo da banda e até mesmo na razoavelmente
bem sucedida turnê Page & Plant.
O problema mesmo foi com Robert Plant,
que se mostrou desde o início contrário à ideia, por considerar, segundo o
corolário de Lemmy, que o Led vivia melhor na memória das
pessoas. Em parte por conta de estar ciente de que sua forma atual não
permitiria mostrar os falsetes de outrora e muito menos o famigerado sex
appeal, em parte porque os anos finais da banda coincidiram com uma espécie de
inferno astral do vocalista, que geralmente é bastante reticente em relembrar o
passado. Depois de muita conversa e de uma retórica que apelou bastante para o
carinho que Plant nutria por Ahmet, o cantor por fim acabou cedendo,
mas mediante algumas exigências (quem quiser saber mais, leia o excelente Quando Os Gigantes Caminhavam Sobre A Terra,
de Mick Wall):
- Exigência número um: nada de Heavy Metal, que o resto da banda
esquecesse qualquer possibilidade de executar Immigrant Song e, para desespero de Page, Achilles Last Stand.
Foi um tiro certeiro no coração de Page,
que sempre considerou essa sua obra prima;
- Exigência dois: as músicas
deveriam ser executadas o mais próximo de sua versão original, ou seja, nada de
grandes improvisos;
- A terceira exigência já era
esperada, e causava calafrios a todos os envolvidos, pois se referia a Stairway To Heaven. Curiosamente, ao
contrário dos piores pesadelos de todos, Plant
disse estar preparado para cantá-la. Mas não ao final do show. E que o fosse
discretamente, sem nenhum anúncio ou pantomima, pois Plant queria mandar a mensagem que ele tanto acreditava, existiu Led antes dessa música e continuou existindo
após ela.
O excelente "Quando Os Gigantes...", de Mick Wall |
Negociações terminadas, o show
ainda ganharia toques de dramaticidade: Jimmy
Page quebraria o dedo de uma das mãos próximo à data inicialmente marcada,
o que adiaria o show em duas semanas. Com o disco novo de Robert Plant, com Alison
krauss, chamado Raising Sand,
ganhando uma sonora atenção da mídia, muito chegou a ser especulado de que o
adiamento do show teria como verdadeira razão uma desistência de Plant.
Plant, Krauss e o álbum da (quase) discórdia |
Aos poucos o gigante acordou
Após os já citados shows de
abertura e a exibição de um breve vídeo no telão, Good Times Bad Times toma a Arena
O2 de assalto. A banda parece tão confusa quanto a platéia e o que se
seguiu foi uma seqüência de tentativas e erros: os cincos primeiros números foram
apresentados por uma banda insegura e errática, com diversos erros se
alternando com momentos que de longe lembravam os tempos de glória. Curiosamente,
resenhas da época do show dão conta que foi exatamente nesse período de cinco músicas
que o som da arena esteve próximo do inaudível de tão confuso (algo corrigido
nessa versão em Blu-ray, que possui um som fantástico), e talvez tenha sido
isso que atrapalhou um Zeppelin já
enferrujado pelo tempo.
Sim, a voz de Plant está gasta, mas ele sempre teve
problemas em reproduzir sues agudíssimos falsetes ao vivo e ao menos no meu
entendimento, fez o trabalho nesse show com a dignidade que seus anos bem vividos
permitiram. Ainda que em momentos como Since
I’ve been Loving You e Dazed And
Confused a coisa beire o limite do aceitável. Nessa última temos o único
momento em que Plant cedeu aos
improvisos, e um prá lá de gasto Jimmy
Page tem seu momento clássico de exibicionismo com o arco de violino, com o
excelente Jason Bonham segurando
como sempre as pontas, tal qual seu velho pai fizera antes.
A platéia, respeitosa e em um
silêncio estranho a um show de rock, segue o restante do show em uma reverência
moderna, mais preocupada em registrar em seus celulares os momentos do que
realmente vivê-los. Me pergunto se os tais 20.000 ingressos não caíram nas mãos
de uma multidão de frígidas e homens de gelo. E se a platéia não demonstra
grande animação, a banda parece se divertir mais a cada minuto que passa, o que
fica claro em The Song Remains The Same
e Misty Mountain Hop.
Kashmir recebe uma releitura excelente e é chegado então o bis, com
as previsíveis e bem vindas Whole Lotta
Love e Rock And Roll.
Saldo Final
Com excelente som, edição correta
e uma qualidade de imagens magistral, Celebration
Day é o registro perfeito de uma noite tão única quanto imperfeita. Uma pena
que não há nenhum extra incluso, pois os bastidores da preparação desse show devem
ter sido ainda mais interessantes que o mesmo.
E apesar do receio da banda em
lançar esse material, vale ressaltar que trata-se de algo consideravelmente
melhor que o fraco The Song Remains The
Same, infeliz registro ao vivo em vídeo da banda em uma noite ruim de sua
fase áurea, registro esse que conta com a antipatia de todos os membros
sobreviventes do Led.
p.s.: os dois CDs encartados na
versão em Blu-Ray trazem todas as músicas do show com qualidade de mixagem
bastante boa.
Ficha Técnica
Banda (Nacionalidade): Led
Zeppelin (ING)
Título (ano de lançamento): Celebration
Day (2012)
Mídia: Blu-Ray (+2CD)
Gravadora: Warner (Nacional)
Faixas: 16
Duração: 124’
Rotule como: Hard Rock, Classic Rock, Heavy
Rock
Indicado para: precisa mesmo
dizer?
Pô, tem qui ve qui os cara tão tudo velho já.
ResponderExcluirÉ tudo classico, é o qui vale.
Sabe onde encontro o show pra baixa?
Opa, bem vindo
ExcluirÉ verdade, a idade pesa.
Não sei onde nem como baixar arquivos hoje em dia. Mas tem link para assistir ao show inteiro no youtube, é só procurar.
Valeu
Trevas
Nada feito pelo Zeppelin me desagrada. O status de banda cult (de quem?) também server como um aditivo para a mística!
ResponderExcluirE não ter rolado Achilles foi golpe baixo do seu Planta!
Fala, Krill
ExcluirNão acho Led ruim, em absoluto, mas não entra no meu top 5 das bandas setentistas não. E infelizmente para mim, Achilles é uma de minhas favoritas da banda.
Abracetas
Trevas