segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

King Diamond – Songs For The Dead Live (Box Set – 2019)




Capirotagem Em Alta definição
Por Trevas

Chega a ser difícil acreditar que um artista tão reconhecido pelo apelo visual de suas apresentações ao vivo nunca tenha lançado um Home Video em sua extensa carreira. Pois é, mas esse é caso do dinamarquês King Diamond, que pretende tirar o atraso com esse Songs For The Dead, que nos traz duas apresentações completas, uma em ambiente fechado e outra num festival, focadas em sua para lá de bem-sucedida turnê de retorno após um infarto que quase lhe levou mais cedo para o colo do capeta.

O Box e suas guloseimas 
Apresentação

Songs For The Dead vem em uma penca de formatos: DVD duplo + Cd; Blu Ray e um opulento Box Set. E é justamente o Box Set que analisaremos aqui na Cripta. O mesmo compreende a soma das edições em DVD duplo (mesmo conteúdo do BD) + CD, Blu-Ray e um CD bônus (com o áudio do show do Graspop). Isso tudo em um pacote cheio de delícias para colecionadores. São elas: uma réplica do Set List do Graspop assinado (uma pena que o “autógrafo” é impresso); uma réplica do cartaz do show; um pôster da turnê; dois stage passes e uma palheta. Tudo embalado numa caixa de papelão que emula um case de instrumento musical. Um pacote belo e caprichado, que pode ser visto em detalhes no Unboxing que fiz no vídeo abaixo.



Áudio e Vídeo

Todo o cuidado com a apresentação de nada serviria se não fosse acompanhado de igual esmero nas imagens e no som. Para nossa sorte, os shows foram captados em altíssima definição, com tomadas e edição criativas que só engrandecem a por si só já impressionante produção de palco. E as performances individuais da agitada banda também não escapam do olho mecânico sagaz. E isso sem deixar de lado as imagens da galera ensandecida, sempre instigada pela presença de palco hipnótica do carismático Rei Diamante. O Som? Tão impressionante quanto esperaria o mais otimista dos fãs. E a qualidade sonora também está excelente nos Cds, o que é ainda mais raro.


Os Shows – Performances e Set List

Olha, realmente fica difícil acreditar que o Rei esteja com 60 anos nesses shows. Já tive a oportunidade de ver o Dinamarquês ao vivo duas décadas atrás e a performance dele naquela noite não se equipara ao que vemos nos dois shows aqui presentes, a perfeição é tamanha que logo apostaria em toneladas de overdubs. Mas basta buscar outros shows gravados não oficialmente dessa turnê para entender que, seja lá o que a experiência de quase morte trouxe na cachola do maluco, essa epifania fez um bem danado para sua performance. Contando apenas com a ajuda da esposa e cantora Livia Zita, ele destrói, e nenhuma música fica aquém de sua contraparte de estúdio.


E não é só o patrão que está na ponta dos cascos, não. Andy La Rocque e Mike Wead formam uma dupla de guitarras forjada nas profundezas do inferno. E a cozinha composta por Pontus Egberg e Matt Thompson (que rolo compressor é esse cara!) parece tocar por telepatia. Sem tempo para respirar, as músicas se seguem e os caras agitam bastante, como se conhecessem cada uma das notas desde 789 encarnações passadas.


O repertório se repete nas duas apresentações, com uma ou outra mudança de ordem. A primeira parte do show traz um apanhado da carreira do tio Diamante, com dois números do Mercyful Fate, a segunda metade centrada na execução integral de seu disco mais famoso: Abigail. Apesar das reclamações dos fãs mais ardorosos, que gostariam de ver todos os discos representados, é indiscutível que o resultado final funcionou monstruosamente bem! E apesar dos repertórios gêmeos, a ambiência diferente dos dois shows justificam a dobradinha. Apesar do público maior no Graspop, a atmosfera fica ainda mais legal no mais intimista Phillmore. Se há realmente algo que poderia causar alguma reclamação mais justa, é a ausência de making off, entrevistas ou qualquer outro extra.



Veredito da Cripta

Alta definição de imagens, grandes performances e uma sonoridade bem cuidada podem produzir grandes Home Videos. Mas existe um outro elemento, difícil de explicar, que eleva alguns desses registros de shows a um patamar ainda mais alto. Seria a atmosfera? Ou a interação entre público e banda? Ou uma noite particularmente inspirada dos músicos? Tudo isso junto? Não sei. Mas sei que esse Songs For The Dead tem exatamente esse algo mais, um bem-vindo elemento sobrenatural que faz desse ao vivo um clássico em potencial. Coloque para rodar com o volume no talo e perdoe King Diamond por ter demorado tanto tempo para nos entregar essa pérola! Obrigatório!


NOTA: 10


Gravadora: Metal Blade Records (importado)
Prós: produção visual impecável, som de primeira e grande performances
Contras: ausência de extras
Classifique como: Heavy Metal
Para Fãs de: Mercyful Fate



terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

Moonspell – Lisboa Under The Spell (Box-Set – 2018)




Lisboa Em Chamas!
Por Trevas

A maior banda de rock pesado da história de Portugal, a despeito de uma carreira para lá de produtiva e do reconhecimento internacional, é bastante econômica em seus lançamentos em vídeo. Afora o ótimo Lusitanian Metal e um ou outro DVD bônus encartado nas edições especiais de seus álbuns, os grandes shows dos Moonspell só podiam até então ser conferidos na íntegra em Bootlegs ou filmagens toscas no YouTube. Talvez por ter se apercebido já ter passado a hora de um Home Video caprichado, o quinteto preparou uma noite ambiciosa em fevereiro de 2017, no Campo Belo, casa com grande capacidade. O plano? Registrar com produção para lá de caprichada uma noite especial, onde três de seus trabalhos mais icônicos seriam tocados na íntegra. O pacote, sintomaticamente nomeado Lisboa Under The Spell, foi lançado em vários formatos. O formato analisado aqui é o do Box-Set, prontamente adquirido por este que vos escreve, sabidamente um grande fã dos caras. 

Fanâ e um dos brinquedinhos da produção caprichada do show
Apresentação

O Box é caprichado, contendo um Blu-Ray, um DVD (mesmo conteúdo do BD) e os três Cds, cada qual para um dos atos do show. Tudo encartado (e encaixado em miolos de acrílico) em belo mediabook encapsulado por uma capa em cartão. A arte do pacote é bela e o design interno, informativo e contando com fotos excelentes da noite do show.

O Box Set 
Documentário:

O documentário é a perfeita contraparte para a excelente biografia Lobos Que Foram Homens (ler resenha aqui), repleta de filmagens para lá de pitorescas. Aqui acompanhamos os lusos em cenas que retratam desde tarefas prontamente identificáveis e mundanas como preparar o café para a esposa e as crianças, praticar atividades físicas, rever risonhamente imagens do passado com os colegas tomando uma birita e fumando umas ervas, até tarefas nada comuns aos reles mortais, como guiar uma banda internacionalmente reconhecida em suas peripécias criativas/administrativas. Os preparativos para a grande noite também aparecem aqui, sempre em takes despojados. Com legendas em inglês para os não lusófonos, é um apanhado para lá de agradável que nos faz sentir parte dessa simpática e batalhadora alcateia. A edição já é emendada com os shows, o que garante uma maratona para lá de bem-vinda aos fãs dispostos a reservar 3 horas de seu tempo junto à maior banda Portuguesa da história.


O documentário espia os homens por debaixo desses lobos aí

Os Shows

Arena abarrotada de fãs dispostos a cantar cada nota junto à banda, produção de palco de altíssima qualidade e ótima captação de imagens em alta resolução, com takes e edição bem pensados, que conseguem alternar performances, plateia e os detalhes da produção esmerada sem que tudo pareça um grande videoclipe. Tudo isso se perderia caso os Moonspell não fossem uma máquina funcional em cima dos palcos. Mas eles hoje são sua melhor versão ao vivo, uma alcateia que, mesmo sem contar com os mais virtuosos dos músicos, atende a um padrão alto de qualidade de espetáculo e musicalidade.



O repertório é dividido em três atos, cada um replicando um disco da carreira dos lusos na íntegra. O primeiro ato com Wolfheart, o segundo com Irreligious e o terceiro com o então disco novo, Extinct. A escolha tem uma explicação simples: Wolfheart e Irreligious, a despeito do impacto que causaram à cena europeia em seus lançamentos, vieram em uma época de consolidação da banda, e as suas turnês tinham um Moonspell majoritariamente servindo de opening act para outras bandas, tendo então a restrição habitual de tempo de palco. Logo, o material clássico desses trabalhos, afora as mais manjadas, raramente viu a luz do dia nas turnês posteriores. E é para lá de bacana ver o quanto esses discos, em especial Irreligious, sobreviveram ao teste do tempo, soando ainda melhores interpretados ao vivo por uma banda mais madura e proficiente. A plateia participativa, os coros reais e a presença de Mariangela DeMurtas (Tristania, esposa do guitarrista Ricardo Amorim) em Raven Claws ainda ajudam a tornar as versões aqui mostradas melhores que suas contrapartes de estúdio.


O terceiro ato, com o bem mais moderno e complexo Extinct encerra um ciclo que demonstra que, a despeito da evolução musical da banda, que experimentou muito em cada disco nesse interim, há uma lógica estética clara. Jamais poderiam acusar não ser a banda que fez Wolfheart capaz de anos depois entregar o belo Extinct, interpretado com emocionante excelência. Talvez o único senão resida no fato que o som do Blu-Ray e sua mixagem não acompanhem o visual Blockbuster da noite. Não, o som não é ruim, apenas mais cru do que se imaginaria. Tal pormenor estético fica ainda mais claro no áudio dos Cds. O lado bom é que efetivamente a experiência fica mais próxima de um show real, nada parece sonoramente superproduzido ou artificial.


Veredito da Cripta  

Lisboa Under The Spell veio ao mundo para suprir a falta de registros ao vivo oficiais do Moonspell.  Trazendo três horas de um ótimo e completo material, acompanhado de um grande esmero na apresentação, temos aqui um pacote dos sonhos para os fãs de uma das bandas mais idiossincráticas da história.


NOTA: 10


Gravadora: Napalm Records (importado)
Prós: produção visual impecável, três horas de um material de primeira
Contras: áudio algo cru, contrastando com a superprodução da noite
Classifique como: Gothic Metal
Para Fãs de: Paradise Lost, Type O Negative, Tiamat




segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Warrel Dane – Shadow Work (Cd-2018)



Um Grandioso Adeus
Por Trevas

Prólogo – Dane, o Vocal-Hero

Mais uma resenha difícil de ser escrita. Warrel Dane foi um dos meus Vocal-heroes, uma inspiração tremenda e que contribuiu com um tempero especial dentro das influências que ajudaram a construir minha identidade musical como vocalista e letrista. Mas minha relação com aquela figura algo excêntrica de longos e indefectíveis cabelos louros (o que provavelmente rendeu ao rapaz o apelido “Dane”- vernáculo levemente pejorativo para quem se encaixa no estereótipo Nórdico) não foi exatamente um amor à primeira vista. Um amigo me apresentou Refuge Denied, do Sanctuary, lá nos idos de 1999. Até achei o disco interessante, mas esbarrei justamente nos agudos estratosféricos de Warrel. Sempre tive dificuldades com vocalistas com registros muito altos. Mas quase que de imediato uma banda despontava na cena com uma sonoridade única, uma tal Nevermore. Escutar Dreaming Neon Black foi um soco no estômago e quando descobri que o versátil cantor, que alternava graves góticos, melodias complexas e, eventualmente, agudos lancinantes, era o mesmo Warrel Dane do Sanctuary, ganhei um novo herói.

Warrel em sua cativante excentricidade
Warrel vinha excursionando desde 2014 na companhia de um excelente time de músicos brasileiros, e em 2017 resolveu selar essa parceria com a gravação de um disco. Infelizmente a jornada foi interrompida ao final do mesmo ano, quando justamente o coração que ele punha em cada nota que cantava o traiu, e Warrel se foi antes de poder gravar os vocais definitivos. O quarteto de músicos e a gravadora fizeram então um esforço hercúleo de juntar os cacos das demos e pré-produção e conseguiram montar um quebra-cabeças de oito músicas, intitulado Shadow Work. O disco ganhou uma belíssima edição nacional em Mediabook, contando com várias ilustrações do mestre Travis Smith. Confesso que custei a colocar a bolachinha, supostamente um trabalho inacabado, para rodar. Mas tão logo o fiz, o coração apertou. Lá vão minhas impressões.

Dane And The Zucas!
Ethereal Blessing abre o trabalho, uma melodia fantasmagórica nos moldes que só Warrel seria capaz de criar, emoldurada sorumbaticamente por sons tribais. Pouco ela nos diz sobre o direcionamento do mesmo trabalho, mas logo somos arremessados a Madame Satan, e aí a sombra do Nevermore aparece. A faixa parece a evolução do que a banda vinha tentando fazer antes de seu precoce encerramento, e chega até a convencer, graças à qualidade dos aliados do estadunidense. Quanto talento os rapazes brasileiros têm!



O mesmo não pode ser dito dos outros momentos Nevermorianos: Disconnection Sistem é menos empolgante e remonta ao Politics Of Ecstasy, disco complexo e algo mecanizado que marcou o corte do cordão umbilical do Nevermore com o legado musical do Sanctuary. Shadow Work, a faixa, é de longe a menos interessante e parece um puxadinho construído por cima do alicerce de Narcosynthesis. Já o encerramento com Mother Is The Word For God quase desperdiça um dos mais belos temas que Warrel já cantou em nove longos e titubeantes minutos de quebradeira.


Mas é justamente quando a banda leva o saudoso vocalista para terrenos anteriormente pouco explorados por ele que o disco vive seus melhores momentos: As Fast As The Others gruda feito piche no cérebro, a reinvenção de The Hanging Garden (do The Cure) é ouro puro, e Rain é aquele cruzamento Metal/Gótico que sempre funcionou tão bem com mr. Dane.



Sobre a performance do vocalista, ainda que ela seja feita de uma compilação de gravações demo ou da pré-produção, tudo funciona bem. Não, você não vai encontrar a performance vocal da vida dele aqui, mas cada palavra é cantada com o coração na ponta da língua, e as melodias são muito boas. As letras? Fortes e únicas, como sempre! Já os músicos, dão um show à parte: Marcus Dotta definitivamente não é humano - é o batera Cthulhu, um destruidor mestre dos polvos; Thiago Oliveira (que compôs todas as músicas autorais aqui) e Johnny Moraes não só sobrevivem ao peso da comparação com Jeff Loomis como trazem inúmeros solos melodiosos que engrandeceram em muito o disco; e até mesmo o baixo de Fabio Carito, por vezes enterrado em meio à multitude de informações da produção, tem seus bons momentos aqui e acolá. Enfim, Warrel se foi em ótima companhia.

O belo mediabook de Shadow Work

Veredito da Cripta

Shadow Work não é o trabalho definitivo de Warrel Dane. Por vezes o disco pecou ao sucumbir à tentação de emular o passado no Nevermore, se saindo melhor quando deixou estilisticamente essa sombra ficar para trás. Mas também está longe de nos dar qualquer pista de se tratar de um corte e colagem qualquer. É sim um disco para lá de digno e instigante, pesado e denso. Um grande e empolgante Cd, que só entristece ao nos fazer sonhar o que seria de uma hipotética continuação se esse vitorioso e virtuoso time fosse mantido. RIP, mr. Dane. Parabéns, Thiago, Johnny, Fabio e Dotta!   


NOTA: 8,57


Visite o The Metal Club
Gravadora: Valhall Music (nacional)
Prós: um disco forte e denso
Contras: nos deixa com imensa saudade  
Classifique como: Modern Metal, Prog Metal
Para Fãs de: Nevermore, é claro...


domingo, 17 de fevereiro de 2019

Imago Mortis – LSD (CD-2018)



Os Brutos Também Amam
Por Trevas

Prólogo: Idiossincrasias e heavy metal
Olá, prezados Criptomaníacos.

Quem me conhece sabe o quanto amo o infame Rock and Roll em boa parte de suas quase infinitas formas.

Você, que frequenta regularmente esse Blog bem sabe disso, tenho tanto prazer de ouvir um Vader ou um Amon Amarth quanto um Fates Warning, um Deftones ou um Steel Panther.

Gosto especialmente de ouvir um pouco de tudo dentro do som pesado.

Tudo, é claro, a depender do momento que atravesso ou do meu estado de espírito.

Mas, embora meu coração tenha uma espécie de bússola que sempre me guie (de tempos em tempos) de volta aos sons mais simples do Rock puro ou do Metal Tradicional, sempre me traz enorme delírio auditivo desbravar discos de bandas inclassificáveis, daquelas que transitam por tantos corredores sonoros e bebem de tantas fontes que tornam seus trabalhos por vezes herméticos ao grande público, a despeito da qualidade de sua obra.
Essas bandas nem sempre me agradam em tudo o que fazem, afinal, por vezes bebem de fontes amargas ao meu paladar. Mas o desafio que proporcionam são um irresistível convite a que eu pare minha vida por algumas horas e brinque de explorador.

Na cena brasuca até mesmo nossos maiores expoentes do heavy metal tem como característica experimentar (Angra e Sepultura se fizeram grandes lá fora justamente por isso). Mas se existe uma banda cuja extensa paleta de cores usada em seus discos é de tamanha idiossincrasia que sempre me atrai como uma mariposa para a luz, essa banda se chama Imago Mortis.

Dona de uma obra curta, mas consistente, e progenitora de Vida, um dos maiores discos de nossa história metálica, Imago Mortis retorna à ativa após longuíssimos 12 anos. LSD é um trabalho conceitual em torno da montanha russa de emoções que envolve a construção e desconstrução de um grande amor, calcado nos exageros de nossa cultura de romantizar demasiadamente relacionamentos.

E é claro, a expectativa para a nova viagem musical não poderia ser menos do que absurda.

O sexteto, como desenhado no encarte
E a abertura, com os 13 minutos de The LSD Theorem já me mostrou que a viagem definitivamente não seria em vão. Elementos de World Music, normalmente alienígenas á bandas de Heavy Metal, aqui integram harmoniosamente a paisagem. Uma paisagem árida e empedernida, como deve ser, já que a matriz rochosa primordial do Imago é o Doom Metal. A música se constrói aos poucos, apresentando o forte tema musical principal e diversas facetas, como que se tentasse sintetizar tudo o que o sexteto preparou para o novo disco ao longo de sua existência. Uma grande música, em extensão e qualidade. A qualidade sonora é excelente, a produção, privilegia a dinâmica, luz e sombras o tempo todo. Mas as onipresentes camas de teclados (pelo talentoso Charles Soulz), destacadas demais na mixagem, me incomodaram tremendamente nas primeiras audições. Não, LSD não é tão calcado nas guitarras quanto se esperaria, mas isso está longe de querer dizer que não é um disco pesado. Binary Viscerae, do próprio tecladista, onde o sempre versátil Alex Voorhes mostra sua faceta Black metal nos versos alternando com seu já famoso estilo operístico no ótimo refrão, que o diga.


E Hieros Gamos segue, um monstro avassalador que facilmente conquistará os fãs dos trabalhos anteriores de imediato, compilando World Music, Doom e extremo com gemidos femininos daquela forma única que só o Imago é capaz. Aqui as guitarras de Daemon Ross e Rafael Rassan pulam à frente dos teclados num novo clássico da banda. E o rinoceronte branco André Delacroix (Metalmorphose, Azul Limão), um baterista para lá de subestimado na cena, comprova mais uma vez sua capacidade inconteste de destruir kits em qualquer estilo.


Alex torna com maestria seu poderoso trinado em um quase sussurro em Incantation, guiando a beleza sorumbática de uma Power Ballad que é o tipo de som que o Leif Edling deve colocar para rolar no dia dos namorados para sua noiva cadáver. Mas nem tudo funciona assim tão bem, a balada seguinte, The Promise, esbarra um pouco demais no Disney Metal.

Não e isso não é nem de longe uma crítica a doce voz de fada de Julia Crystal, que divide os vocais com Voorhes.

Aqui o protagonista encontra o grande amor e o tom adocicado da canção apenas mimetiza aquela fase grudenta que todos já experimentamos alguma vez na vida. Ok, um caso em que o conceito se sobrepõe à música. Muito melhor se sai o dueto de Two-Headed Chimaera. O relacionamento começa a azedar, e nada melhor do que a voz cáustica de Mariana Figueiredo (que me faz pensar numa improvável filha entre Tina Turner e Leather Leone) travando uma intensa DR com Mr. Alex. Simplesmente duas das melhores vozes de nossa cena na mesma música. Aliás, essa faixa tem ótimas performances de todos os músicos.



O baixo de Paulo Ricardo Silva prepara o terreno para o Doom mais puro de A Farewell Kiss, onde a voz mutante de Alex parece encarnar uma versão tupiniquim do monstruoso McCoy, mestre do raramente lembrado Fields Of The Nephilim. Outra faixa que faz o link com o Imago do passado. Black Widow, primeira do pacote a ver a luz do dia, e de longe a mais direta e “simples”, não deixa pedra sobre pedra.


Mas se a dobradinha anterior joga os fãs em terreno razoavelmente conhecido, o mesmo não pode ser dito sobre Alone. Aqui parece que enterraram Gary Moore no cemitério maldito do Stephen King, e ele retornou macabramente e compôs uma versão zumbi-demoníaca do que seria uma de suas emocionantes baladas blues-rock, com belas guitarras chorando. E se a interpretação de Alex Voorhes aqui não te der arrepios e não for suficiente para te convencer de que ele é um dos maiores vocalistas da nossa história, sinto muito, mas é você quem está morto. Melhor procurar o infame cemitério indígena. 



Não sou um grande fã de discos conceituais, e o motivo disso é que raramente eles não sucumbem à pantomima de sacrificar a parte musical em favor do andamento da história. E LSD não escapa a esse mal. Exile é um curto e melancólico interlúdio tocado inteiramente no piano. E Epitáfio de Um Amor, a despeito de fazer imenso sentido dentro da história contada, traz um poema declamado sobre uma trilha musical que a princípio reflete alguns temas do disco e depois parece transmutar para algo saído da trilha de uma nada bem-vinda continuação cinematográfica de Nosso Lar. Mas Love Sex And Death (theme) aparece apoteótica, aos 47 do segundo tempo para nos lembrar de que está se encerrando um dos grandes discos nacionais de 2018.


Veredito da Cripta

LSD definitivamente não é o disco mais pesado do Imago Mortis, mas certamente é o mais complexo e variado. Um trabalho denso e repleto de detalhes, daqueles que cresce perante repetidas audições e que demanda bastante do ouvinte. Mas quem decidir embarcar nessa viagem, dificilmente se arrependerá. Mais um capítulo excelente na carreira de uma das bandas mais idiossincráticas do Metal Brasileiro.

     
NOTA: 8,65

Visite o The Metal Club
Gravadora: Die Hard Records (nacional)
Prós: diversificado e intenso
Contras: teclados em destaque e poema declamado   
Classifique como: Doom Metal, Metal Progressivo
Para Fãs de: My Dying Bride, Primordial, Candlemass


sábado, 16 de fevereiro de 2019

Powerwolf – The Sacrament Of Sin (+ Communio Lupatum - Deluxe Edition – 2018)




Lobisomens Redivivos
Por Trevas

Caro Criptomaníano, a alemã Powerwolf, surgida nos idos de 2003, é a típica banda fácil de se odiar. Corpse Paint, vocalista advindo da música erudita, um Power Metal bombástico, nomes artísticos bisonhos e muito, muito excesso visual, com direito a roupinhas elaboradas pirotecnias e até mesmo o abjeto artifício do uso de Corpse Paint. Mas um ingrediente nessa mistura faz com que toda essa gororoba possa ser digerida sem problemas: os caras estão munidos de um tremendo senso de humor! Quando esse escuta uma pérola como Resurrection By Erection, não dá para bancar o banger sisudo e os exageros passam a fazer parte do charme.

Não, você não consegue ser mais ridículo que essa foto...desista
E parece que ao menos na Europa o pessoal comprou a piada, a banda disco a disco passou de mera curiosidade engraçadinha a postulante a headliner em festivais de verão. O show bombástico e visualmente bem pensado obviamente ajuda, mas o prato principal são os refrães bombásticos, que misturam elementos de música sacra com Power Metal, ornamentados por letras divertidamente profanas e blasfemas.

Edição deluxe, com Communio Luporum
Só que a piada aos poucos parecia perder força, os últimos dois discos (Blessed & Possessed e Preachers Of the Night) soando como versões diluídas do que havia dado muito certo até Bible Of The Beast. O quinteto resolveu então apelar para o mago da moda, o produtor sueco Jens Bögren, para ver se recuperava a mão para a divertida blasfêmia de outrora. E deu sim muito certo. O coro sacro dá as caras nos primeiros segundos da bombástica Fire & Forgive, e todos os clichês são escancarados e desconstruídos com maestria em pouco mais de 4 minutos.


A primeira música de trabalho, Demons Are A Girl’s Best Friend mostra aquele apreço por melodias grudentas e letras lascivas que podem soar irritantes ou irresistíveis dependendo da rabugice dos ouvidos receptores. Os vocais roufenhos de Attila Dorn são aquela coisa entre o roufenho de um Chris Boltendahl (Grave Digger) e Joakin Brodén (Sabaton) com algo mais técnico e talvez sirvam para minimizar a atmosfera exagerada. Fosse um típico vocalista eunuco de Power Metal aqui e eu não aguentaria um minuto.



Killers With The Cross exemplifica de maneira explícita minha fala quando me pedem para definir o som do Powerwolf: é o Sabaton com música sacra e ocultismo nos temas. Sim, Killers poderia estar em um bom disco dos suecos se falasse sobre guerras. A faixa é o paraíso para o fã de Power Metal, e é seguida pela bacaninha Incense & Iron. Mas talvez o ápice do disco seja mesmo a dobradinha formada pela belíssima Power Ballad com cara de Scorpions-mordida-por-um-lobisomem chamada Where The Wild Wolves Have Gone e pela excelente experiência em alemão Strossgebet, que faria o fã de Rammstein passar a frequentar a igreja profana dos caras. 


Daí para frente o disco continua extremamente divertido, emoldurado pela produção grandiosa mas para lá de bem calculada e cheia de punch de Bögren, ainda que definitivamente nenhuma das faixas restantes alcance o poder de fogo da primeira metade da bolachinha, talvez excetuando Venom Of Venus.



Veredito da Cripta

O Power Metal, geralmente um pária aos ouvidos deste escriba aqui, certamente ganhará um representante na minha vindoura lista de melhores discos de 2018. Sacrament Of Sin é o renascimento dos lobisomens teutônicos e provável postulante a melhor trabalho de suas carreiras. Um disco deliciosamente brega e divertido.

NOTA: 9,12


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Communio Lupatum

A edição deluxe é um caprichado box com dois belíssimos mediabooks. O primeiro é o Sacrament Of Sin propriamente dito. O segundo é o surpreendente Communio Lupatum, improvável disco que traz dez faixas do Powerwolf interpretadas por gente tão diversa quanto Mille Petrozza, Battle Beast, Heaven Shall Burn, Eluveitie e Epica. Os resultados são para lá de divertidos, justamente por que os artistas não são em sua maioria bandas típicas de Power Metal, mas conseguiram traduzir o estilo único do Powerwolf para seus próprios mundos. Um dos bônus mais legais e diferentes que já vi e que só mostra o quanto as músicas dos alemães são bacanas mesmo afastadas do exagero audiovisual que os cercam. 

Communio Lupatum e sua bela capa

Gravadora: Nuclear Blast (importado)
Prós: produção impecável, ótimas músicas
Contras: pode soar muito brega dependendo do ouvinte  
Classifique como: Power Metal
Para Fãs de: Sabaton


sábado, 9 de fevereiro de 2019

Rolo Tomassi – Time Will Die And Love Will Bury It (Cd-2018)




Beleza no Caos
Por Trevas

Os britânicos do Rolo Tomassi , formado pelos irmãos Eva e James Spence em 2005, tem seu nome escolhido sabiamente de um trecho do filme Los Angeles Cidade Proibida, e qualquer outro comentário que eu faça sobre isso pode se tornar um infame spoiler. E foi justamente o nome baseado em um dos meus filmes favoritos que me fez prestar atenção nessa patota, incensada como um dos expoentes da vanguarda criativa do underground da terra da rainha.

Eva, James e seus estranhos amiguinhos nerds
Quem colocar o quinto e mais recente disco de estúdio deles para escutar vai se assustar de início, após uma etérea introdução, Aftermath aparece, e uma voz angelical (Eva Spence) adorna um som tranquilo e viajante, ainda que algo quebrado. Bela canção, mas que diabos Trevas faz trazendo esse tipo de som aqui na Cripta?


E aí Rituals começa e a cabeça do incauto ouvinte/leitor vai entender menos ainda do que está a acontecer: acordes dissonantes, peso apocalíptico e ritmos quebrados. Como que num filme de terror a pequenina Eva se transforma de um ser angelical num demônio que cospe guturais sincopados em cima de riffs ora extremamente técnicos, ora minimalistas. É como se o quinteto bebesse de tantas fontes diferentes e ousasse misturar essas fontes como tanto esmero ao ponto de sequer conseguirmos entender de onde vem o que.



E quando você pensa que começou a entender tudo, números épicos e diversos como The Hollow Hour aparecem para fritar os miolos. Diria que para definir, ainda que toscamente, o som do Rolo Tomassi, deveríamos pensar na improvável prole entre o Meshuggah e a Bjork. Parece não fazer sentido, não? Então, é isso mesmo. Time Will Die And Love Will Bury It é um disco estranho, cheio de luz e sombras e dinâmicas quase esquizofrênicas, e definitivamente não deve agradar àqueles afeitos a um Rock pesado direto e repleto de Feel Good Moments.


Só lembrar que a faixa de trabalho escolhida é algo tão esquisito quanto Balancing The Dark. E mesmo os belos momentos como em A Flood Of Light, vem encapsulados em reviravoltas, com teclados esquizoides entremeados a vozes limpas e urros.



Veredito da Cripta

Se você anda a procura de uma banda única, encontrou. Aqui a parada é densa e para lá de complexa, exigindo bastante do ouvinte. Pode não parecer um prato para todos, e realmente não é. Mas para quem curte, ainda que vez ou outras, sons desafiadores, e estiver disposto a embarcar na viagem dos irmãos Spencer, eis um trabalho cuja audição pode se tornar imensamente gratificante.

NOTA: 9,20

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Gravadora: Holy Roar  Records (importado)
Prós: um estranho ataque de luz e sombras
Contras: a doideira não é exatamente de fácil digestão
Classifique como: Mathcore, Modern Metal
Para Fãs de: Mr. Bungle, The Dillinger Scape Plan, Meshuggah, Bjork