terça-feira, 26 de agosto de 2014

Judas Priest – Redeemer of Souls (Deluxe Edition - Cd Duplo- 2014)

Redeemer Of souls
The Priest Is Back!!!!
Por Trevas

Prólogo: O Ocaso de Uma Lenda do Metal

Final de 2012. Rob Halford, então com 61 anos, enfrenta o momento que havia adiado por anos a fio, uma perigosa cirurgia em sua coluna.

O Metal God convivera herculeamente por quase duas décadas com uma hérnia de disco bastante séria, a compressão de seu nervo ciático se agravando ano após ano, ocasionando dores lancinantes que limitaram seus movimentos mais básicos, transformando sua performance nos palcos em um simulacro robótico do Halford de outrora. Durante a Epitaph Tour, o problema se agravara ao ponto de limitar até mesmo uma simples caminhada. Halford sobreviveu noite após noite da turnê fazendo shows de duas horas de duração com a ajuda de uma bengala e um cetro, devidamente disfarçados de complementos dos figurinos extravagantes do vocalista.

Halford e sua bengala com James Hetfield
Os riscos da operação eram bastante grandes, Rob poderia ficar paraplégico ou até mesmo morrer, mas a dor era tamanha que a escolha pareceu fácil. A cirurgia foi um sucesso. O tempo de recuperação, assustadores 12 meses, parte deles confinado a uma cadeira de rodas. Tempo suficiente para Rob se acostumar com a ideia de pendurar em definitivo suas pesadas botas.

Mas a sensação de vitória sobre as limitações físicas impostas pela idade e o confronto com a própria ideia de mortalidade apenas revigoraram os brios do Metal God. “O Heavy metal é imortal, mas infelizmente aqueles que criam as músicas não são agraciados com tal dádiva”, filosofou Rob para a Classic Rock Magazine. O tempo restante é curto, e seria bobagem não aproveitá-lo ao máximo. E Rob respirou e viveu o Heavy metal diariamente até agora, e assim escolheu o fazer pelo restante do tempo que lhe sobrar.

Em paralelo, Ian Hill e Glenn Tipton passam esse ano sabático tentando, sem sucesso, se adaptar a um mundo sem Judas Priest. Mas a aposentadoria da cena musical, que atraiu irrevogavelmente o fundador da banda, KK Downing, hoje um biliardário empresário do ramo do Golfe, não conquistou seus ex-companheiros.

Os três membros mais antigos da atual formação do Judas (o que aconteceu com Scott Travis nesse período é uma incógnita, para variar) voltaram então suas esperanças para um jovem de 30 anos, Richie Faulkner, o clone rejuvenescido de KK que salvara a Epitaph Tour. O prodigioso guitarrista, que fizera a banda soar revigorada nos palcos teria sua magia testada em uma missão árdua: gravar um disco que fizesse justiça ao legado de uma das bandas mais emblemáticas da história do rock.

Judas Priest na Epitaph Tour
O teste

Contratando os serviços de Mike Exeter (produtor dos discos solo de Tony Iommi e do único rebento do Heaven & Hell, além de engenheiro de som de 13, do Black sabbath), a banda se trancou em estúdio em um período de testes. O resultado, um punhado de canções inicialmente não programadas para ver a luz do dia, agradou a todos. Certos de que o que quer que produzissem não macularia a discografia do Judas Priest, resolveram então partir para as sessões de composição, dessa vez para valer. As faixas resultantes das sessões de teste terminariam na edição deluxe do novo disco, como analisarei mais à frente.

Exeter com o Heaven & Hell
Arte Gráfica

O artista escolhido para trabalhar o conceito de Redeemer Of Souls foi Mark Wilkinson, famoso pelas capas clássicas do Marillion, além de já ter trabalhado com a banda várias vezes anteriormente (em Painkiller e Ram It Down, com maior destaque). A ideia seria pegar o anjo caído de Sad Wings Of Destiny e transportá-lo a um futuro árido que remete à destruição vista na capa de Painkiller. O anjo seria o redentor do título, lutando em meio ao caos em nome da perpetuação do heavy Metal. Nonsense total, nada mais Judas Priest.

Painkiller, um dos mais famosos trabalhos de Wilkinson
O disco – faixa a faixa

Vento, chuva e trovoadas nos transportam ao terreno pós-apocalíptico representado na arte de capa. Rapidamente o riff principal de Dragonaut eclode. Típico Judas, ainda que com uma nova roupagem. A produção coloca o som bem cru e na cara, uma clara resposta aos excessos de Nostradamus, com Halford sobressaindo na mixagem. Ótima ponte e um refrão diferente, somados a um belo trabalho de guitarras apostando nos clássicos duelos de solos, e o início se mostra promissor.


A faixa título evoca o elo perdido entre Defenders Of The Faith e Painkiller, caso a confusa fase Turbo/Ram It Down nunca tivesse existido. Linhas melódicas perfeitas, solos cativantes, bateria e baixo concisos. Presença certa nos futuros set lists.


Rob Halford berrando “Valhalla” em meio a um turbilhão de solos e riffs. Difícil algo soar mais descaradamente metal que isso, não? Isso acontece na terceira faixa, o épico Halls Of Valhalla, que traz passagens de guitarra bem diferentes para o padrão Judas, com a levada de bateria de Scott Travis empolgando num dos melhores momentos do disco. O refrão, ao apostar num enfoque vocal bem cru, expõe um pouco o desgaste do sexagenário Halford. Mas o cara continua tendo uma voz e poder de interpretação invejáveis.


Sword Of Damocles apresenta um leve toque celta em suas linhas de guitarra, mais um dos pequenos detalhes idealizados por Faulkner e que deram uma revigorada no som da banda. Halford mostra música após música estar com a criatividade em alta, trazendo melodias grudentas, que soam como Judas Priest sem remeter explicitamente a trabalhos passados. A passagem acústica ao meio da música é exemplo de um dos grandes diferencias das grandes bandas de outrora, a preocupação com a dinâmica. Uma de minhas favoritas do disco.


March Of The Damned foi uma das primeiras músicas do novo trabalho liberadas pela banda, e decepcionou muita gente. É um Heavy Rock grudento que em muito lembra material do Ozzy Osbourne, em especial pela interpretação de Rob, que remete tanto ao estilo do Madman que chega a assustar. Uma música legal que faz mais sentido dentro do contexto do álbum do que escutada isoladamente.



Ainda apostando numa veia Hard/Heavy, temos a excelente Down In Flames. Soando como algo que muito bem poderia ter sido composto para Defenders Of the Faith/Screaming For Vengeance, fará a felicidade daqueles que amam o metal da segunda metade dos anos 1980.


Começando com um trecho acústico que remete a algo do Nostradamus, Hell & back dá espaço ao baixo pulsante de Ian Hill e a um riff que evoca o Judas dos anos 1970. 
Infelizmente, o faz sem grande sucesso.

Judas Priest 2014
Tal qual Down In Flames e a faixa título, Cold Blooded poderia bem fazer parte de um álbum hipotético situado entre Defenders Of The Faith e Painkiller. Uma faixa bacana, mas dá a impressão de que falta algo. Tem pinta de Lado B.

O calouro Richie Faulkner
O peso retorna em Metalizer, mas a qualidade não. Riffs cortantes e ótimos solos caem por terra diante de letra e refrão que soam quase como uma paródia da banda. Diga-se de passagem, no refrão Rob soa algo como King Diamond...começo a ficar preocupado com o restante do disco.

Mas a partir daqui o disco volta ao padrão de qualidade de suas primeiras músicas. Se Hell & Back havia falhado em ressuscitar o espírito do Priest setentista, Crossfire o faz com louvor. Ótima performance de toda a banda, com destaque para as guitarras e para um Halford que mostra mais uma vez que o tempo pode ter tirado algo de potência e alcance de sua voz, mas que interpretação e feeling não se perdem jamais.


Secrets Of The Dead é bastante boa e, devido a sua sonoridade, poderia muito bem estar em Nostradamus. Cadenciada e sombria, prepara o terreno para a uptempo Battle Cry, reminiscente do lado mais puramente metal do Judas, uma ótima faixa que fará felizes aqueles que reivindicam o retorno à sonoridade de Painkiller.



O título Beginning Of The End parece brincar com a primeira faixa de 13, do Black Sabbath. Mas a referência limita-se ao título. Trata-se de uma bela balada que encerra o primeiro disco com majestosa imponência.

Saldo Final

Mais uma vez o Judas Priest encontra forças sabe-se lá aonde e retorna à ativa revigorado e reinventado. Redeemer Of Souls navega com maestria pelo passado da banda ao mesmo tempo que traz novos elementos (ainda que sutilmente) ao som clássico do Judas Priest, cortesia de Richie Faulkner. Não é um disco perfeito e a crueza da produção pode incomodar alguns ouvidos mais exigentes, mas posso dizer sem medo de errar que se trata do melhor trabalho lançado pelos britânicos desde o clássico Painkiller.

NOTA: 8,5

Disco bônus
O Segundo disco da edição deluxe traz cinco faixas curtas e diretas. As mesmas foram compostas e gravadas antes do restante do material, de maneira descompromissada, com o objetivo de testar se a química que a nova formação demonstrara nos palcos poderia ser transposta para o universo árido dos estúdios. O resultado convenceu a todos os envolvidos com a banda, que resolveu então adiar em definitivo o encerramento das atividades e escrever mais um capítulo em sua longa história.

Sabiamente a banda resolveu não manter esse material na gaveta, ainda que o mesmo estilisticamente tenha pouquíssimo em comum com as músicas da edição regular de Redeemer Of Souls.

Judas Priest posando para a Classic Rock Magazine
Snakebite emula a pegada do material de discos como British Steel e Hell Bent For Leather com maestria. Aquele metal com pitadas de hard rock cativante que elevou o Priest ao estrelato no início dos anos 1980. Old school e bem divertida.

Tears Of Blood é mais uma faixa que poderia facilmente ser tomada como um lado B há muito perdido de Defenders Of The Faith. Particularmente, gosto bastante dos solos dessa faixa.

Creatures confirma a tendência oitentista do material extra, um tiro certeiro a despeito da letra para lá de batida (dá para fazer um disco inteiro com faixas que versam sobre Creatures Of The Night...).

Bring It On é outra a trazer a chancela Hard/Heavy de meados dos anos 1980 e o material extra só não ganha medalha de ouro por conta da xaroposa balada Never Forget, que a despeito do nome, é para lá de esquecível e remete a coisas de bandecas de hair metal.

Saldo Final

Um disco bônus que faz jus a sua existência e mostra que a banda teria grandes chances de sucesso caso se contentasse em produzir um disco com o intuito de emular sua fase de maior sucesso. Para os saudosistas de plantão, uma sobremesa e tanto.

NOTA: 8

Prós:
Um Judas Priest revigorado e de paz com o passado.
Contras:
Produção bastante direta pode incomodar.

Classifique como: Heavy Metal

Para Fãs de: Heavy metal clássico em geral

Ficha Técnica
Banda: Judas Priest
Origem: ENG
Site Oficial: www.judaspriest.com/
Disco (ano): Redeemer Of Souls – Deluxe Edition (2014)
Mídia: CD Duplo
Lançamento: Sony (Importado, versão nacional simples disponível)

Faixas (duração): CD 1 - 13 (62’).
CD 2 – 5 (20’43”)

Produção: Mike Exeter
Arte de Capa: Mark Wilkinson

Formação:
Rob Halford – voz;
Glenn Tipton – Guitarra;
Richie Faulkner – Guitarra;
Ian Hill – baixo;
Scott Travis – bateria.